28/12/2004

TSUNAMI

Não se fala de outra coisa por aqui - e de certeza que não há-de ser diferente em Portugal e no resto do Mundo. A dimensão da tragédia que se abateu hoje de manhã nesta zona do globo não tem precedentes.

Fui dar uma volta aqui pela internet e parece que já se contam mais de 28 mil mortos e 30 mil desaparecidos.

Estou neste momento em Bombaim, na costa ocidental da Índia, depois de ter passado o Natal em Goa. Estou no "lado certo", portanto. Aqui o tsunami só chegou nos telejornais.

Não há muito mais a dizer, por agora. As imagens que passam na televisão falam por si, e os números só confirmam o horror que se está a viver aqui na Índia, na Indonésia, no Sri Lanka e nas Maldivas, e até na Malásia e Birmânia.

E na Tailândia! Phuket, Phi Phi e o "meu paraíso secreto", Railay... tudo virado de pantanas, mil mortos entre os quais 700 estrangeiros... :(

Volto para Goa daqui a pouco. Já estão comigo a Joana e a Assunção, chegaram ontem à tarde e ao choque natural de chegar à Índia pela primeira vez, estão também a viver este drama emocional que concerteza vai marcar a História deste nosso mundo.

25/12/2004

FELIZ NATAL (DE GOA)

Pelo segundo ano consecutivo, não passo o Natal em casa.

No ano passado pareceu-me um feito inédito. Achei que não voltava a acontecer. Fiquei em Bangkok, onde fui ao cinema e passei a tarde numa piscina com vista para o skyline da cidade. Estava, nessa altura, já na fase final da viagem que serviu de inspiração para este blog.

E agora estou em Goa - quem diria.

Ontem celebrei a véspera de Natal com um jantar muito especial, em casa de um amigo do Caxemira, que cozinhou uma galinha com coentros deliciosa, para mim e mais três pessoas. Eu era o único católico, os outros muçulmanos.

Mas o espírito de Natal ultrapassa credos, e foi realmente uma noite especial.

Depois de jantar saímos para uma festa trance, algures numa floresta não muito longe daqui... mas confesso que no meio destas voltas todas, o coração estava em Sintra. Quando telefonei para casa a desejar boas festas, deu-me um aperto ao ouvir a minha família, do outro lado.

Hoje à noite volto para Bombaim, de autocarro. São catorze ou dezoito horas, conforme o trânsito e o estado de espírito do driver. Daqui a dois dias chega a minha prima Joana e a Assunção, uma amiga da "velha guarda" - ficamos uns dias por Bombaim e depois passamos uma semana juntos em Goa. Calha bem, com as saudades que "bateram" hoje. ;)

20/12/2004

OM BEACH

Tem nome de mantra e ares de paraíso.

Mas não... não vou dizer mais nada sobre esta praia nos arredores de Gokarna - esperem pelas fotografias e confirmem com os próprios olhos.

UMA SEMANA DEPOIS

Eu sei que já passou praticamente uma semana desde a última vez que escrevi alguma coisa - azar!

Mas como dizem os ingleses, "no news is good news", e se não tenho partilhado nada aqui no blog é porque tenho andado ocupado nas voltas da boa vida.

Portanto: a última vez que vim aqui ao cyber-espaco (gosto da expressão, posso?) estava em Bangalore, a tal cidade muito europeia para a India... mas muito indiana para a Europa.

Depois de Bangalore fui para Mysore - que, apesar das expectativas, revelou-se uma surpresa boa. Claro que os inúmeros palácios por todo o lado ajudaram... bem como a ida a um templo no topo de uma montanha, onde fiquei a conhecer a estátua gigantesca de um touro preto, que obviamente é a reincarnação de um qualquer deus hindu (dizem que a estátua cresce um centímetro por ano). Mas o que mais me impressionou - surpresa! - foi o Palácio do Marajá. Não: desta vez não conheci o senhor em pessoa, parece que este vive não-sei-onde e só aqui vem de vez em quando - por isso ficou combinado para outra altura ;)

Vale a pena visitar a cidade, nem que seja pelo Palácio. Nenhuma foto faz justiça ao monumento - e infelizmente só tenho fotos exteriores, uma vez que era proibido levar a câmara para dentro do mesmo.

Enquanto estava em Mysore, ainda fui visitar uma terrinha não muito longe, que em si nem era nada de especial, mas que tinha um forte bem giro - e também o Palácio de Verão do Sultão Tipu.

Mas adiante, porque a praia espera-me. Estou estafado: tantas voltas e palácios depois, preciso de descansar. É que depois de Mysore ainda fui para Madikeri, uma cidadezinha no meio de montanhas, numa área conhecida pelas suas plantações de café, banana, arroz e pimenta. Fiquei em casa de uma família no meio da floresta, sem electricidade e com uma casa-de-banho espectacular, que tinha lareira para aquecer a água; e aqui passei uns dias, servindo a casa de base para vários trekkings entre aldeias e plantações de café, campos de arroz e montanhas, etc. Muito giro. E muuuuuuuito cansativo.

Ontem estive das sete da manhã às dez da noite em quatro autocarros. Primeiro da aldeia nas montanhas para Madikeri; depois de Madikeri para Mangalore; e daqui para Kumta... e finalmente para Gokarna, onde estou. Mais ou menos duzentos quilómetros a sul de Goa. O lugar é lindo e ainda nem vi as praias, que dizem ser do melhor.

Preciso de descanso, já disse.

Preciso de me deitar um bocadinho à sombra de alguma palmeira a ouvir o mar. E assim que puder, assim que tiver energias... volto aqui e conversamos. Espero que não passe mais uma semana.

14/12/2004

A CRÓNICA DO KARNATAKA

E depois de Goa: Hampi.

Confesso que não fazia parte dos meus planos iniciais, vir agora a Hampi - estava a guardar esta volta para quando a Joana e a Assunção viessem a Goa, no fim do mês. Mas afinal elas têm ainda menos tempo que o previsto, por isso devemos ficar só por Bombaim e pela antiga colónia portuguesa - o que já não é nada mau, acreditem.

Ir a Hampi implicava pelo menos dois dias e três noites, no mínimo... por isso decidi aventurar-me agora, e não me arrependo nada.

Hampi é aquele tipo de lugares que... é obrigatório. Pronto, já disse.

E com isto não devia ser preciso dizer mais nada, mas deixem-me explicar melhor o que é Hampi.

Hampi é uma antiga capital de um império qualquer, não me perguntem agora o nome porque não me lembro - mas só para terem uma ideia do fausto que a dada altura se viveu, contam os antigos que há uns quinhentos anos chovia ouro por lá. As ruas da cidade eram decoradas com diamantes, rubis e outras pedras, e o rei de vez em quando tinha a mania de oferecer ao povo o seu peso em ouro. Claro que depois de muitas guerras e saques e séculos de abandono, resta pedra e pouco mais. Mas que ruinas!!! São quilómetros e quilómetros (e quilómetros!) de templos e monumentos, uns em bom estado e outros mais degradados; e estátuas, aquedutos e todo o tipo de intervenção na paisagem que se pode esperar de uma "cidade perdida", incluindo uma espécie de praca que é o exlibris de Hampi, onde está uma enorme carruagem de Vishnu, em pedra, mais um pavilhão onde as colunas fazem música, quando se bate nelas - e que aparece em tudo o que é postais. Dizem os guias que o rei Não-Sei-Quantos ficou de tal forma impressionado com esta praça que a considerou bonita demais até para um rei, e por isso mudou-se para outro palácio, por não se considerar digno de viver ali.

Estou a viajar pelo Karnataka, portanto.

Depois de dois dias a passear numa mota alugada pelas ruínas de Hampi; depois de uma breve passagem por Hospet e algumas aventuras de riquexó; estou finalmente em Bangalore, capital do estado e uma cidade muito ao estilo europeu, nem parece que estou na India. Relativamente limpa, cheia de jardins e parques e avenidas enormes, centros comerciais e lojas... enfim, estou aqui há sete ou oito horas, já me fartei de passear e estou quase de partida outra vez, apetece-me qualquer coisa mais calma.

Vou hoje à tarde para Mysore, dizem que é um espectáculo bonito de se ver, uma espécie de Sintra daqui da zona - a ver vamos.

10/12/2004

EU (EM GANAPATIPULE, SEM LIGADURA)

Sim: sou eu.

Sim: em Ganapatipule (adoro este nome).

E sim: já não tenho a ligadura na perna.

Tirei esta fotografia no primeiro dia em que tirei a ligadura; na verdade ainda tenho a compressa, mas aqui não se vê. Já estou quase "curado", já sou eu que limpo a ferida todos os dias, já mudo a compressa e até voltei a pôr a ligadura, mais por uma questão de conforto que outra coisa. E quando voltar a Goa, daqui a uma semana ou duas, estarei pronto para me vingar e ficar horas e horas no mar.

GANAPATIPULE

Deliciem-se, babem-se, chorem e façam o drama que quiserem fazer. Batam com as mãos no peito, arranquem os cabelos e desmaiem entre gritos, se forem mais facilmente impressionáveis e adeptos do estilo Bollywood.

Senhoras e senhores: apresento-vos a praia de Ganapatipule, onde estive uns dias (e onde espero voltar em breve).

Um paraiso perdido a quinhentos quilómetros de Bombaim e trezentos de Goa. 


UMA MANIF

Centenas de mulheres a desfilar pelas ruas de uma aldeia, gritando palavras de ordem que não entendo. Um boneco deitado num caixão com a fotografia de um homem que não reconheço. Outro boneco enforcado - mas a fotografia colada no rosto é a do mesmo homem que está no caixão. Nos cartazes, palavras numa língua que não consigo ler.

Pergunto ao meu amigo Abbey o que se está a passar, se é alguma manifestação a favor dos direitos da mulher, uma greve por melhores condições de trabalho, ou alguma coisa do género... mas não. Nada disso. Longe disso. O senhor nas fotografias é um actor de Bollywood que, numa entrevista transmitida esta semana na televisão, fez um comentario pouco simpático sobre a aldeia onde estas mulheres vivem. E vai daí, cartazes e caixão e uma forca.

É este o poder de Bollywood na Índia. Não são só filmes que as pessoas vão ver ao cinema - isto é quase uma religião. É uma industria que mexe com a sociedade, que a influencia, que mexe com tradições e contradições, capaz de fazer sonhar os mais pessimistas, mas também de irritar o mais pacífico dos indianos.

Este tipo de manifestações não é raro no país, fiquei a saber. Há alguns anos, por exemplo, houve motins e quase começou uma guerra civil entre hindus e muçulmanos, tudo por causa de um comentário feito por uma actriz de Bollywood.

O VENDEDOR DE BANANAS

Depois dos enfeites na autoestrada, bananas.

Infelizmente voltámos a ficar na miséria, eu e os meus amigos indianos: sem gasolina e sem dinheiro, fomos obrigados a recorrer a soluções-limite. Enquanto o Abbey e os outros vendiam o corpo aos camionistas, eu fiquei a vender babanas as pessoas que passavam - privilégios de estrangeiro.

;)

TCHIM TCHIM

Apresento-vos o grupo da quase-pescaria: eu, o Berty, o Abbey e o outro senhor do lado direito da fotografia é um amigo deles cujo nome já não me lembro. Desculpe, senhor do lado direito da fotografia.

O momento foi registado num restaurante de uma terrinha já muito perto da fronteira entre os estados do Gujarat e do Maharashtra, antes de chegarmos a casa... e antes de sabermos que o mar estava péssimo e os pescadores bêbados. Os outros pescadores.

À BEIRA DA ESTRADA

É verdade que tenho andado na boa vida - mas quando é preciso por as mãos na lama, contem comigo. A fotografia que partilho neste post é prova disso mesmo. Numa das idas-e-vindas à quinta do Abbey, ficámos subitamente sem dinheiro, e precisavamos de pôr gasolina... por isso eu e o Berty tivemos de "safar a malta". Enquanto os outros arrumavam carros em troca de umas rupias, nós arranjámos alguns daqueles enfeites que os camionistas gostam de pôr nos espelhos retrovisores e lá fomos para a beira da estrada, a ver se fazíamos uns trocos.

E por falar em estradas.

Mais um apontamento sobre este país de loucos: quando um carro ou um camião avaria ou tem um furo, os indianos NUNCA se dão ao trabalho de tentar tirar a viatura da estrada e resolver o problema em segurança na berma. Deixam-na onde estão... e esqueçam triângulos a cem metros de distância e outras mariquices às quais chamamos "medidas de segurança": aqui o pessoal arranja umas dez ou vinte pedras e faz um perímetro a volta do camião. Tipo um murinho. Tão querido. E há quem ponha também uns ramos de árvores a sair das janelas dos carros, que fofinho.

Outro pormenor: não há espelhos laterais e poucos são os condutores que usam o espelho retrovisor para se orientarem com o trânsito à volta. O que está a dar na Índia é buzinar. A buzina utiliza-se ao máximo, seja para o que for mas especialmente em ultrapassagens, sejam elas pela direita, pela esquerda, por cima ou por baixo, ou mesmo entre camiões. À noite, só se ligam os faróis em situações extremas. E sempre nos máximos.

Nas estradas da Índia, mais do que ser visto - interessa é ser ouvido.

Ou não tivessem pintado nas traseiras dos camiões: HORN OK PLEASE.

PS: o primeiro parágrafo deste post é brincadeira.

BOMBAIM É UMA FESTA

Uma não: muitas.

Mas a internet é tão lenta aqui, mas tão lentaaaa... que entre todas as fotografias já tiradas em Bombaim e que se vão acumulando todas as semanas, decidi partilhar apenas uma. Esta foi em "minha" casa, na festa de anos do meu anfitrião, o Rajeev. Ao meu lado está a Poonam (irmã do Rajeev) e outro amigo, o Moonty.

Reparem nos postais atrás de nós: a Torre de Belém e o Palácio da Pena.

OSHO

O Osho Ashram, em Pune, é um dos ashrams mais famosos da Índia. Passei lá no outro dia, só para dar uma vista de olhos, e confesso que já ia de pé atrás quando entrei... e muito mais, quando saí. Este ashram, como tantos outros, é um lugar para onde as pessoas vão para praticarem meditação, onde podem fazer uma espécie de retiro, provavelmente conhecerem-se um pouco mais.

Mas uma das principais diferenças do Osho para outros ashrams é que o guru defende que não é preciso muito esforco e dedicação para este tipo de retiro... ou seja, este é um lugar onde, além da parte mais espiritual, os "hóspedes" podem usufruir de ténis, jacuzzi, sauna, biblioteca, etc - tudo num lugar onde a arquitectura completa o luxo, a preços nada compatíveis com um suposto desinteresse pelo dinheiro, que o senhor Osho tanto apregoava.

Um spa espiritual, portanto.

Os "hóspedes" passeiam-se por Pune vestidos numas túnicas cor-de-vinho, falando sobre os seus encontros com a verdade e as energias superiores que emanam, e dentro do ashram vêem-se pessoas a dançar e a meditar - e há quem se entusiasme pela espécie de política de sexo livre, o que pode explicar em parte o sucesso do lugar. Para lá ficar em "retiro" é obrigatório fazer um teste de HIV, além de disponibilizar uma boa quantia de "ouro" do tesouro pessoal.

Mas há mais: comprei um livrinho do senhor, só para ficar a conhecer melhor as suas teorias... ainda só li trinta páginas e tem sido um fartote, apesar de algumas partes bem interessantes. Diz o guru que quem come pastilha elástica tem instintos homicidas, que é um assassino em potência; e diz também que a escola é má para as crianças e todos os professores têm um complexo de tirania; diz ainda que pior do que comer pastilha elástica é fumar, beber ou comer... e falar. Aliás: falar é das piores coisas que podemos fazer, e por várias vezes durante o livro ele aconselha vivamente toda a gente a calar-se.

Claro que no meio de tanta reflexão, há partes bastante interessantes. Quem sou eu para contrariar um guru. Mas a verdade é que o que me devia levar a uma reflexão sobre a vida e a minha maneira de estar e ser... está, afinal, a revelar-se uma comédia.

Outro pormenor: antes de visitar o ashram, tive de ver um video sobre o Osho e as suas técnicas e ideias. Entre imagens de passarinhos a voar, rios a correr e borboletas no ar, o senhor ia aparecendo (parece o Bin Laden, acreditem no que vos digo) e lá ia partilhando algumas ideias e verdades. Umas mais fantasiosas, outras bem profundas e verdadeiras. Mas onde eu quero chegar é a este pormenor: durante o video, o guru troca três vezes de relógio, e cada um tem mais diamantes e ouro que o anterior. Enfim: luxos de guru!

09/12/2004

DOIS MESES

ILUMINAÇÃO

Completei dois meses de viagem há dois dias - para ser sincero, não houve qualquer tipo de comemoração especial, nem tinha de haver. Passei o dia quase todo enfiado num autocarro. E, no entanto, eu gosto de números e efemérides, e nunca é demais celebrar datas.

Aqui entre nós: às vezes preciso deste tipo de incentivo como desculpa para tomar decisões e ter ideias novas. Estava eu muito bem (ou nem por isso) no autocarro entre Pune e Ratnagiri quando me lembrei que, como já disse aqui, se completavam dois meses na estrada... ou seja, o tempo total que passei na Índia, no ano passado. E por mais estúpido ou irrelevante que isto possa parecer, tive a sensação que, a partir deste momento, tudo seria novo e diferente.

Comecei a reflectir sobre o tipo de ideia que podia desenvolver num texto, no blog - e não me conseguia lembrar de nada, durante alguns quilómetros quando de repente uma luzinha acendeu-se em cima da minha cabeça. E não: não era a lâmpada das bandas desenhadas, simplesmente estava a ficar escuro e alguém acendeu a luz. Mas esses pormenores não interessam para nada agora: porque neste momento de inspiração decidi que, em vez de escrever apenas sobre as aventuras e o meu dia-a-dia aqui na Índia, já tinha experiência no terreno suficiente para, de vez em quando, deixar aqui no blog alguns apontamentos sobre o país e a sua cultura, sobre os indianos e as suas excentricidades, os insólitos e as curiosidades... sobre o tipo de observações que uma pessoa faz ao vivo, quando viaja, e que eu posso deixar aqui registado.

Hoje, no entanto, fico-me pelo relato dos últimos dias. Mas prometo que em breve começo a partilhar mais sobre este país completamente doido, capaz de nos enervar ao extremo e logo a seguir nos seduzir.

FUI DAR UMA VOLTA

Deixei Bombaim há quatro dias, acho eu (sinceramente, já não faço as contas aos dias... e confesso que estou meio perdido, no que ao calendário diz respeito). Encontrei-me com o meu amigo Ashroft e fomos de autocarro para Pune, onde ficámos apenas um dia. Lembrem-me que tenho de falar do famoso ashram de Pune, eheheh... só rir. E sobre o livro que eu estou a ler agora! Mas falo disso amanhã ou depois.

Portanto: um dia em Pune e mais outro num autocarro para Ratnagiri, seja lá o que isso for, ou onde for. E depois outro autocarro... e eis-me numa praia chamada Ganapatipule.

E como fui eu parar a um lugar chamado Ganapatipule, que nem sequer aparece nos mapas, a não ser nos mapas de Ganapatipule? (sim, eu gosto deste nome, agora que finalmente o decorei apetece-me dizê-lo muitas vezes. Ganapatipule.)

No meu passeio de mota pelo Maharashtra, há umas semanas atrás, vi num hotel uma fotografia de uma praia... uma pequena e inofensiva fotografia que me deixou a sonhar naquele lugar durante quase todas as noites até há dois dias atrás.

Perguntei na recepção onde ficava aquele pedaço de Paraíso - seria na Índia? É na Índia, sim senhor... e chama-se Ganapatipule, disse-me o recepcionista. Tomei nota do nome, até porque não o consegui decorar logo de início - e fui pesquisar um bocadinho na net, apesar da lentidão angustiante da ligação. Anotei as direcções e anunciei ao Ahsroft que não me ia embora da Índia sem conhecer aquela praia.

E pelos vistos nem foi preciso esperar muito, porque afinal o lugar até ficava mais-ou-menos-a-meio-caminho de Goa. Passei lá uns dias, a dormir num templo hindu (isso mesmo: um cristão e um muçulmano a partilhar um quarto num templo de Ganesh!), e só me vim embora porque tínhamos encontro marcado com o Hamid e o Shoo Shoo em Goa.

Já cá estou em Vagator, fico aqui dois ou três dias a pôr a conversa e os sorrisos em dia - e depois sigo para Sul, sozinho a explorar o estado de Karnataka e quem sabe um pouco mais.

Amanhã falamos de Pune, do ashram, do livro que eu estou a ler e de algumas curiosidades. Pode ser? :)

Fui!

04/12/2004

OLHA EU

Olha eu em Vagator.

T-shirt nova, todo vaidoso. A praia é linda, o mar um espectáculo... mas até o paraíso pode ser um lugar angustiante. Não posso ainda tomar banho no mar, por causa da ligadura que tenho na perna.

Imaginem a minha infelicidade.

VAGATOR

Eu com os meus dois amigos de Fardapur, o Tarely (mais conhecido por Shoo Shoo) e o Hamid.

Na rocha por baixo de nós, uma cara esculpida. Shiva.

O responsável foi um hippie inglês, há uns vinte ou trinta anos ou mais. Há quem faça rabiscos e outros grafittis, outros esmeram-se um bocadinho mais e depois dá nisto.

E já agora aproveito para chamar a atenção a outro pormenor desta fotografia: a minha perna direita... sim, o famoso pêlo encravado de que já falei aqui, ou seja lá o que foi que me levou à faca naquele hospital de Bombaim.

Há vidas. ;)

FINALMENTE AS VACAS

Ainda não tinha partilhado aqui nenhuma fotografia de vacas, desde que estou na Índia.

Eu sei que é quase imperdoável... mas só quase!

Estava à espera de um daqueles "momentos", até agora não tinha apanhado nada de especial - até que enfim encontro um grupo destes sagrados animais em amena cavaqueira, a trabalhar para o bronze numa bela praia de Goa.

Que queridas, e que santas... mas cuidado com os montes de bosta que deixam espalhados pela areia. 

BRAGA?

Adivinhem onde é que esta foto foi tirada.

Em Braga?

Nada disso: em Panjim, a capital de Goa.

FÁBRICA ORIENTAL

Panjim é uma delicia.

Pormenores como este encontram-se por todo o lado, e para qualquer tuga de passaporte e de coração, é de ficar todo babado.

03/12/2004

SERÁ DESTA QUE EU ME PISGO?

Eu sei que era suposto já me ter ido embora de Bombaim. Eu sei que no último post eu disse que estava prestes a deitar-me à estrada - mas ainda aqui estou.

What to do?, como se diz por aqui em jeito de conformismo.

Depois do triplo-aniversário de amigos houve uma mega-festa numa das melhores discotecas cá do galinheiro, e achei que justificava ficar mais um dia. E depois veio um canal de música fazer uma reportagem, ou um documentário, sobre o meu amigo Abbey, e queriam os amigos dele a contar histórias pessoais.

Ou seja: aqui o vosso amigo vai ser uma estrela da TV indiana, eheheh.

No próximo dia nove vão para o ar os meus cinco minutos de glória: eu, a falar de outra pessoa! ahah

Mas foi giro, e a apresentadora também.

Adiante:

Ontem acabei por ir com o Abbey e uns amigos para a quinta de um deles, junto da fronteira com o Gujarat, supostamente para uma pescaria que depois não acomteceu - e voltei há bocadinho, estafado apesar de não termos posto sequer um pézinho na água. O mar estava péssimo, o dono do barco estava bêbado - acabámos por ficar em casa à conversa, a beber e a cantar à volta da fogueira.

Hoje há mais uma festa em Bombaim, dizem que vai ser boa. E eu não tenho coragem de ir embora.

Mas amanhã estou definitivamente de partida, por muito ressacado que esteja. Estou farto de tanto adiar o passeio, e cada dia a mais em Bombaim é menos um dia no resto da Índia.

30/11/2004

OUTRA VEZ EM BOMBAIM

Ontem voltei para Bombaim, mas so por tres ou quatro dias. O Bunny destruiu metade da casa, passamos a tarde em limpezas e arrumacoes. O Rajeev fez anos e tivemos jantarada e festa ate as tantas da manha, la em casa. Hoje um dos meus "sobrinhos" tambem fez anos, fomos todos almocar fora, e amanha eh a vez de uma amiga minha - a Seema. E assim completa-se o trio responsavel por esta minha rapida passagem ca por casa.

Assim que estiver despachado das festas, pisgo-me outra vez. O Abbey estava a pensar fazer uma "fishing trip" num rio nao-sei-onde, ainda estou a espera de saber se vamos mesmo ou nao. De qualquer maneira, ja tenho mais ou menos planeado encontrar-me com o Ashroft para mais dois ou tres dias no Maharastra; e depois vou para Goa outra vez, e se tudo correr bem vou passear um bocadinho pelo sul - pelos estados de Karnataka, Kerala e Tamil Nadu.

Quanto a fotos, houve um problema que vai demorar uns dias a resolver. Ja aqui esta a dos Cantinho dos Afonsos, as outras ficam por publicar ate a proxima semana.

CANTINHO DOS AFONSOS

O Cantinho dos Afonsos eh uma casa que fica no Bairro das Fontainhas, em Panjim - rodeada de outras casas com azulejos e pequenos apontamentos de portugalidade. Achei piada ao nome, aos azulejos, as cores tao portuguesas, as saudades de casa.

26/11/2004

AINDA EM GOA

Ainda aqui estou. Nao tenho feito muita praia, porque estou "condicionado" - mas em compensacao tenho andado na boa vida, muito descanso, optima comida e alguns passeios. O pessoal de Bombaim ja voltou para casa e eu continuo com o Hamid e o Shoo Shoo, os dois de Fardapur. Depois de Baga e Calangute fomos experimentar Arambol: a praia eh um espectaculo, muito calma, mas cheia de israelitas - o que por um lado da cabo do negocio aos meus amigos, e a mim da-me cabo dos nervos. Ou seja, voltamos para Calangute.

Na quarta feira passei o dia em Anjuna e ontem fomos ver Vagator.

Manel, Foca e Kamal: esquecam a primeira impressao desta praia, no ano passado! Nao sei como eh que nao gostamos do lugar, sinceramente este ano cheguei la e tive a sensacao que estava num sitio completamente diferente. A praia eh linda, muito calma, so gente porreira... uma das minhas preferidas em Goa, sem duvida. Palolem, pelo que se diz, esta a abarrotar e perdeu metade da piada, so vale pela praia em si. Mas voltando a Vagator: amanha estou la batido outra vez.

Hoje o dia foi passado em Panjim, com uma sul-africana e uma alema que conheci ontem na praia. Fomos ver a parte velha da cidade, marcar o meu regresso a Bombaim e a viagem de uma delas a Hampi, e depois levei-as a ver o novo sucesso de Bollywood, Hulchul.

Amanha, como ja disse, estou de volta a Vagator. E assim que tiver fotografias disponiveis, contem com elas.

23/11/2004

SURPRESA!

Estou em Goa.

Eu sei que parece um bocado precipitado, principalmente depois do ultimo post; mas no domingo estava a entrar em depressao so de pensar que ia ficar sozinho em Bombaim mais uns dias, e como os meus amigos de Fardapur insistiram o suficiente (nao foi preciso muito, confesso), telefonei ao meu medico a perguntar se podia vir para Goa e ele deu-me autorizacao:

"Desde que mudes as compressas e ligaduras todos os dias; desde que descanses e nao andes por la aos pulos e no mar... nao ha problema, podes ir."

Entre descansar-e-nao-fazer-nada em Bombaim... e descansar-e-nao-fazer-nada em Goa, obvio que optei pela segunda hipotese. E ainda bem. Depois de uma viagem de autocarro de quase dezasseis horas (que drama... e com a perna assim...) la cheguei a Madgao. Dez minutos de riquexo depois, o mar. Praia, areia, ondas, chapeus-de-sol, musica - adoro isto.

Nao tinha dito nada ao grupo de Bombaim. Quando cheguei, liguei-lhes a dizer que tinha um amigo portugues em Goa que estava sozinho e que ia ter com eles, e depois apareci no bar la da praia - qual nao foi a surpresa quando me viram, foi so rir. E qual nao foi a minha surpresa (um bocado pela negativa, confesso) ao ver que quase toda a gente se tinha ido embora nesse dia, e so restavam quatro... alem disso, depois de meia hora com eles, nem queria acreditar: estava tudo de trombas uns com os outros, so discutiam, um stress. Ainda tentei acalmar mais ou menos os animos, o ambiente foi melhorando durante a tarde, mas ao jantar estava quase tudo na mesma. Ainda bem que nao vim sozinho - ja me desmarquei deles, eheheh. Estou com os dois gajos de Fardapur, hoje vamos a Arambol ver a loja que um deles vai explorar, e daqui a dois dias devemos ir para la de vez: fico com eles uns quatro ou cinco dias, depois volto a Bombaim. Ah!, mas o melhor de ontem a noite foi reencontrar as pessoas que conheci no ano passado, fizeram-me uma festa enorme. O unico que ja nao esta ca eh o Sunil, o gajo que ia a guiar a mota quando tive o acidente.

Goa... se por um lado eh uma chatice nao poder tomar banho no mar e ter de estar sempre preocupado com a ferida, ter extra cuidados com areia, etc; por outro lado, nao podia estar melhor - estou em Goa! O tempo esta optimo, come-se bem e sejamos praticos: entre estar trancado numa casa em Bombaim, e trancado numa praia em Goa... ;)

18/11/2004

AZAR

Nao sei se eh a minha perna direita que nao gosta da India, ou se eh a India que nao gosta da minha perna direita.

No ano passado foi o acidente de mota em Goa... e este ano deu-me para encravar um pelo ou qualquer coisa do genero, ainda nem me apercebi muito bem o que aconteceu - so sei que a perna direita comecou a infectar e a inchar, fui a uma clinica aqui ao pe de casa e deram-me uns antibioticos, e sem saber muito bem como, dei por mim deitado numa sala de operacoes, ontem a noite, a rezar para que tudo corresse bem.

O lugar era um cenario de um filme de terror: azulejos verde-escuros, instrumentos e todo o tipo de maquinaria medica de metal, enormes, muito pesados, com um ar gasto... so faltavam os salpicos de sangue. Tinha quatro ou cinco enfermeiras ah minha volta, todas muito baixinhas (deve ser requisito aqui na India - as altas vao pra Miss Mundo). E eu deitado na cama, no meio da sala, a minha mao a apertar a da minha amiga Isa... que por sorte (e que sorte) eh enfermeira na Suica. Enfim, detalhes a parte: depois da anestesia local fizeram-me um corte de 5 ou 6 centimetros na perna, abriram a coisa e drenaram todo o pus e sei la mais o que, umas celulas mortas, nao quero saber. Depois puseram la um bocado de gaze ou algodao especial, nao sei, embebido em Betadine... e agora repouso absoluto!

Ou seja, e deixem-me abreviar a frustracao: ja nao vou hoje para Goa! Nao eh preciso dizer mais nada, pois nao? Vou ter de ficar uns dias de castigo em casa, sem me mexer, repouso (quase) absoluto.

Vou agora mudar o penso e tirar aquela coisa que esta dentro da perna, tomar uma injeccao... e posso dizer que esta tera sido a unica actividade deste (muito-muito) longo dia.

16/11/2004

VEER-ZARA

Ok, desta vez eh mesmo um titulo de um filme de Bollywood. Alias, do grande hit deste Diwali. Os melhores actores, um dos melhores realizadores indianos e uma campanha de marketing de fazer inveja a muitos filmes americanos. A receita eh quase garantida, e o filme - agora posso dizer com conhecimento de causa - eh muito bom.

A historia trata de um indiano (Veer) que esta preso no Paquistao ha 22 anos, e quando uma advogada paquistanesa vem ter com ele e lhe diz que esta disposta a ajuda-lo, ele comeca a contar a historia da sua vida. Flashback: duas decadas antes, o nosso heroi era co-piloto de um helicoptero que fazia operacoes de salvamento, e num belo dia salvou uma donzela de um autocarro que caira de uma ravina. Acontece que Zaara era uma paquistanesa que tinha vindo a India para espalhar as cinzas da sua ama indiana no Ganges, e como ele estava prestes a viajar para a sua terra natal, embarcam os dois numa viagem pelo Hindustao.

As paisagens sao o que se pode esperar de um grande classico, as musicas e dancas e planos e dramas sao do melhor que se faz em Bollywood, mas o que realmente marca este filme sao os dialogos (eu, infelizmente, fico limitado as traducoes que os meus amigos me vao fazendo durane o filme) e todas as mensagens de optimismo num futuro melhor entre o Paquistao e o Hindustao. Tanto na familia do Veer (indiana e pobre) como na de Zaara (paquistanesa e rica) se vao viver momentos muito intensos, com dialogos poderosissimos - e mesmo que a historia fosse fraquinha (que nao eh), o filme ja valia pela mensagem de esperanca numa relacao fraterna e de boa vizinhanca entre os dois paises.

BHAIDUJ E EID

Nao, o titulo deste post nao tem nada a ver com filmes de Bollywood, duplas de actores ou nomes de musicas.

O Bhaiduj e o Eid sao dois dias de festa - mais dois. Passo a explicar: 

Bhaiduj

Celebra-se dois dias depois do Diwali e eh uma especie de Natal entre irmas e irmaos. Neste caso, os irmaos nao tem de fazer nada, e sao as irmas que rezam por eles, dao-lhes presentes e doces. Eh um momento muito especial nas familias indianas; e a partir do momento em que tambem eu praticamente ja faco parte de uma, claro que tambem fui mimado pelas minhas "irmas". Rezaram por mim, deram-me presentes, partilhamos doces (o irmao da a primeira dentada, a irma come o resto) e no fim uma delas pos-me na testa uma pintinha encarnada com arroz. O Rajeev, o meu anfitriao, tem quatro irmas - o Bhaiduj em casa dos Khinchi foi so mais uma festa, mas muito especial. 

Eid

Ao contrario do Bhaiduj, que eh uma festa hindu, o Eid eh um dia muculmano. Mas como qualquer festa na India, eh celebrado por todos, seja qual for a religiao. Festa eh festa. O Eid marca o fim do Ramadao. Ou seja, acaba-se o jejum, as privacoes, e toca a desbundar. Na noite antes do Eid, eh preciso ver a Lua - e no dia propriamente dito, eh um festim.

Este ano o Eid praticamente coincidiu com o Diwali, ou seja, as principais festas das duas maiores religioes na India aconteceram num espaco de tres ou quatro dias - e o ambiente nao podia ser melhor. Hoje ah noite tenho um jantar em casa de um amigo ca de Bombaim que normalmente vive em Londres, mas veio ca passar dois meses para estar com a familia durante o Ramadao (sao muculmanos, obvio). E so por curiosidade, a avo do Sohel vive em Oeiras (!) e ele passa a vida a ir a Portugal - o mundo eh mesmo tao pequenino...

13/11/2004

FINALMENTE AS FOTOS V

Bibi-Ka-Maqbara, mais conhecido em Aurangabad pelo Mini Taj.

Obviamente que nao se pode comparar ah perfeicao do original, mas nao deixa de ser um sitio bem interessante de se conhecer. E ao contrario do outro em Agra, o MIni Taj nao chama multidoes de turistas e as suas maquinas e poses - aqui, pude passear com toda a calma, ganhando forcas para a aventura que estava prestes a comecar... os mais de 500 quilometros que fiz em cima da mota do Ashraft.

FINALMENTE AS FOTOS IV

Jodhpur, a cidade azul. Esta eh so uma parte da vista do forte sobre a cidade, mas da para ter uma ideia da coisa, nao da?

FINALMENTE AS FOTOS III

Esta ja foi tirada ha umas semanas, quando fui passear pelo Rajastao. A esquerda esta o Ishak (manda abracos ao Manel, Foca e Kamal Hassan) e o outro eh o Arif, o tal que se casou em Setembro.

FINALMENTE AS FOTOS II

Este eh o Ashraft, com quem estive a passear de mota pelo Maharastra. A mota foi comprada a meias com o Hamid, para de vez em quando fazerem algum dinheiro a aluga-la a turistas. No meu caso, a aventura comecou em Aurangabad e passou pelas grutas de Ellora (onde esta foto foi tirada), as grutas de Ajanta, Fardapur (onde eles vivem), a cratera do meteorito de Lonar; e Jaigao (de onde regressei para Bombaim), entre outras terrinhas cujo nome nao faco a minima ideia.

FINALMENTE AS FOTOS I

Finalmente consigo por algumas fotos aqui no blog. Sancha, muito e muito obrigado pela ajuda, assim que puder mando mais algumas, eheh.

Esta primeira fotografia foi tirada nas grutas de Ajanta, ja ao fim da tarde. Estava cheio de pressa porque tinha alugado um Ambassador branco (taxi) a meias com um casal indiano, e eles estavam a minha espera para voltar para Aurangabad. Os 27 templos estao mesmo atras de mim, ao longo desta enorme parede de pedra.
 

HAPPY DIWALI!

Finalmente o Diwali.

A primeira vista, o Festival das Luzes eh mais ou menos uma especie de Natal misturado com Ano Novo e Santos Populares - as ruas e as casas estao enfeitadas e iluminadas a rigor; rebentam bombinhas de Carnaval e fogo-de-artificio; as pessoas vem para a rua festejar. Mas o Diwali eh mais que isto: esta eh a altura ideal para se comprar carro, electrodomesticos, roupa, seja o que for. Comprar coisas no Diwali da sorte, e como ha promocoes em todas a lojas, melhor. No Diwali telefona-se aos amigos, enviam-se SMS com bombinas a rebentar, combinam-se noitadas de cartas, toda a gente se veste a rigor. Oferecem-se doces, enfeitam-se os carros com flores amarelas e pintam-se desenhos de todas as cores no chao, junto a entrada da casa. Acendem-se velas nos parapeitos das janelas, nos degraus, nos telhados, nos para-choques dos camioes - onde houver espaco para acender uma vela, acende-se.

A palavra Diwali tem a sua origem em Deepavali, sendo que Deepa significa Luz e Avali quer dizer Seta. Ou seja, Seta de Luzes - e eh exactamente assim que se pode descrever esta enorme festa: as luzes sao a maior expressao do espirito do Diwali, seja nas luzinhas de Natal a piscar em quase todas as janelas de quase todos os predios; na iluminacao publica que enfeita a maioria das ruas e edificios; nas arvores completamente envolvidas em pequenas lampadas; nas tais velinhas que, como ja descrevi, sao espalhadas por todo o lado, onde houver um centimetro quadrado que seja; no fogo-de-artificio que rebenta a cada instante no ceu; nos foguetes e bombinhas que os miudos lancam nas ruas;

Pobres e ricos, novos e velhos - toda a gente entra no espirito, ate muculmanos e cristaos e outros. E esta alma portuguesa que aqui anda a fazer sabe-se la o que, obviamente tambem se vestiu a rigor e foi passear pelas ruas, comprou roupa nova e jogou cartas, ofereceu doces as maes dos amigos e telefonou a toda a gente a desejar um Feliz Diwali e Bom Ano Novo. Tambem enfeitei a janela da minha casa, acendi luzinhas e velas e fui rezar num templo hindu... mas ah boa maneira catolica.

E por agora eh tudo, desejo a todos um Feliz Diwali - e para os que ja me insultaram por nao colocar fotografias no blog, fiquem a saber que ja ha algumas a caminho.

12/11/2004

DHOOM MECHALA

Corrijam-me se estiver enganado, mas acho que ainda nao falei do grande hit musical do momento: Dhoom Mechala. Desde que cheguei ha India (pouco mais de um mes!) que esta musica esta por todo o lado. Faz parte da banda sonora de um filme de accao, com muitas motas e assaltos e explosoes; e ouve-se por todo o lado, na rua, nos riquexos, cyber-cafes, restaurantes e obviamente passa duas ou tres vezes por noite em cada discoteca e em todas as festas, seja em Bombaim ou na aldeia mais remota do Rajastao... confesso que ate ja sonhei com o Dhoom Mechala. Eh daquelas cancoes que entram por um ouvido... e primeiro que saiam pelo outro, eh um drama. Ficam dias inteiros bem vincadas naquela massa cinzenta que temos entre as orelhas, ja ouviram falar? O cerebro, isso mesmo.

Mas afinal, o que tem a ver um filme sobre motas (mau, por sinal) com o meu passeio por grutas, mosteiros budistas e lagos criados por meteoritos, entre outras paisagens?

Passo a explicar:

Depois daquela primeira introducao a Aurangabad e ao mini Taj-Mahal, embarquei numa aventura que tao cedo nao esqueco: estive cinco dias a viajar de mota com um indiano pelo estado de Maharastra. Por estradas de alcatrao, buracos e lombas; por caminhos de terra, lama e pedras. Visitei as espectaculares grutas de Ajanta com os seus mosteiros budistas; as Indiana-jonescas grutas de Ellora, ao nivel de lugares tao imperdiveis como Angkor Wat (Cambodja), Borobudur (Indonesia) e afins; e ainda um lugar chamado Lonar, onde ha 5 mil anos caiu um meteorito, formando a terceira maior cratera deste genero no mundo, e onde hoje se pode ver um lago e uma paisagem de cortar a respiracao. E o melhor de tudo:P nao vem nos guias - ou seja, quase ninguem sabe deste lugar, eu era o unico turista num dos tres hoteis la do sitio.

Mas antes e depois do passeio, Faradpur - uma aldeola no meio do nada, com zero coisas de interesse para fazer, mas onde acabei por conhecer um grupo que vai provavelmente ficar para sempre: alem do tal indiano que me levou a passear, o seu irmao e o melhor amigo; e tambem a familia e a vizinhanca. Ate ja temos combinadas novas farras em Goa e, imagine-se, Damao! Sim, aquele cantinho que, juntamente com Diu, eh constantemente esquecido. Mas tambem estes lugares eram portugueses, e para me certificar disso mesmo la estarei em janeiro, se Deus quiser.

E ja que falo em Deus, uma curiosidade: estes novos amigos indianos sao todos muculmanos, e como estamos em pleno Ramadao, alguns estavam a jejuar. Era sempre uma festa quando chegava as seis da tarde e eles voltavam da mesquita, iamos todos jantar fora ou a casa de alguem, sempre tres ou quatro na mesma mota, a boa maneira indiana. E eu, esta-se mesmo a ver, radiante com esta "imersao cultural", ahahah. So pela piada ate fui ao barbeiro la da terra, no meio de uma tempestade de trovoada, vento e chuva. Nao o deixei cortar barba nem cabelo; mas fiz umas massagens no couro cabeludo, mais um tratamento qualquer a cara... and last but not least, por um dia ate aderi a moda do oleo de coco no cabelo.... Aaarghhh!!!! (percebem a onomatopeia, espero)

Ainda tive oportunidade de assistir, numa sala a cair de podre, a um novo filme de Bollywood; apesar de, so meia hora depois de estarmos na sala, termos percebido que estavamos a ver o filme errado. Mas era um bom filme, daqueles dramalhoes a boa maneira de Bombaim, com muitas lagrimas e musica e olhares e gestos e efeitos sonoros e mil-cores e herois e viloes e donzelas em perigo. (falta-me o folego!) Foram quase tres horas de sangue e lagrimas, e o filme chama-se qualquer coisa tipo "Este era o teu nome" - so pode ser um sucesso. Mas a grande estreia do Diwali eh, sem duvida, o Veer-Zaara (esse era o filme que nos julgavamos que iamos ver, asm estavamos a sessao errada). Uma grande producao, realizado por um dos maiores nomes do cinema-masala, com Sharuk Khan e alguns dos melhores actores de Bombaim... ate ha quem fale de Oscares e coisas do genero. A ver vamos.

Hoje eh o Diwali, ha muito que fazer. Ha uma semana que nao se ouve outra coisa senao bombas e estalinhos e foguetes; ha uma semana que se acendem gradualmente, por toda a India, luzes natalicias, candeeiros em forma de estrela, baloes de Santo Antonio e velas - velas por todo o lado! Penduram-se flores nos carros e nas portas das casas. Compra-se roupa nova, joga-se as cartas, visitam-se os amigos. E se ontem as ruas pareciam estar ao rubro por toda a India, hoje vai ser em grande. So enquanto escrevi este paragrafo rebentaram, na rua em frente, sete bombas (tipo Carnaval) - e muito mais se espera para esta noite de Diwali, o Festival da Luz.

Amanha conto mais qualquer coisa (la vai outro foguete)!

06/11/2004

CONTAGEM DECRESCENTE

Anda tudo doido.

Mal acabou o Navratri, comecaram logo os preparativos para o Diwali. Ontem à noite, quando deixei Bombaim, eram cada vez mais evidentes os sinais da festa rija que aí vem. Há alguns dias que vejo a cidade a preparar-se: acendem-se luzinhas de mil cores por todo o lado, as ruas estão exageradamente enfeitadas, os riquexós ainda mais coloridos do que é costume, saldos e promoções em tudo o que é loja... e claro, ouvem-se rebentar bombas e estalinhos e foguetes a cada dez segundos.

Cheguei hoje a Aurangabad, onde fico tres ou quatro dias antes de voltar para Bombaim, para celebrar o Diwali (este ano é a doze de Novembro). Fui visitar uma espécie de mini Taj Mahal, além de umas grutas aqui perto. E os préximos dias vao ser ricos em arqueologia e história: vou armar-me em Indiana Jones e conhecer finalmente as famosas grutas budistas de Ajanta e Ellora.

04/11/2004

WTF?!

O Bush ganhou?!

A America é, definitivamente, uma anedota. De mau gosto.

BUNNY

O Bunny tem catorze anos, é praticamente cego, não ouve um boi e coxeia. Tem um problema de pele que o deixa praticamente sem pelos, a barriga inchada que nem um balão, está constantemente a choramingar, cheira mal e para completar o quadro, tem sempre a pila de fora.

O Bunny é o meu roommate de Bombaim. É o cão dos meus anfitriões, que antes tinha o privilégio de viver na casa principal - mas o destino ou os deuses lá se juntaram e decidiram que o pai dos meus amigos ia adoecer, e os médicos anunciaram que não podiam ficar os dois na mesma casa, o cão e o dono. O cão mudou-se para o apartamento das visitas - o mesmo para onde eu vim viver mais tarde.

Ontem deixei o Bunny sair à rua, para fazer chichi.

Já não tem força para alçar a perna, por isso urina enquanto anda - devagarinho, quase gota-a-gota. Ao fim de dez minutos de liberdade chamei-o, o nome gritado com umas palmas à mistura; ele deve ter ouvido aquela vozinha muito ao longe e abanou a cauda, veio ter comigo, devagar.

Mas em vez de acertar na porta, chocou contra a parede da casa.

02/11/2004

JEJUM, JACKIE CHAN E YOGA AO NASCER-DO-SOL

Ontem as mulheres indianas casadas estiveram em jejum todo o dia. Não comeram nada de manhã, não comeram nada a tarde inteira - e só tocaram em comida quando viram pela primeira vez a lua.

E este é só mais um dia especial, no colorido e intenso calendário hindu. Como prova de amor pelos respectivos maridos, e de acordo com uma lenda muito antiga, as mulheres hindus fazem jejum durante um dia inteiro, e só o quebram quando alguém lhes mostra a lua. Contam os jornais de hoje que, este ano, 30% dos maridos juntaram-se às suas esposas, em solidariedade com o acto - um gesto bonito, no mínimo.

Quanto às minhas idas e voltas: estou novamente em Bombaim, depois de alguns dias no Rajastão. O reecontro com o Ishaak e o grupo de Jaipur foi engraçado, pelo menos o primeiro dia, mas confesso que ao fim de algum tempo estava farto deles, dos esquemas e dos salamaleques, e vi-me grego para conseguir ir-me embora da Cidade Rosa; além disso cheguei atrasado ;) para os anos do Marajá, por isso desta vez não consegui cumprimentá-lo; e por pouco não me cruzei com o Jackie Chan, que estava a filmar no Rajastão, quase sempre nos lugares por onde andei, mas com um dia de diferença.

Ou seja: estes foram dias mais marcados por desencontros que encontros.

E mesmo assim tive momentos especiais que recordarei com carinho, como a família de Calcutá que conheci numa viagem de comboio e com quem passei horas à conversa - convidaram-me para os visitar em Dezembro; e o condutor de riquexó de Jodhpur que me guiou nas voltas pela Cidade Azul - chamava-se Saleem e além de honesto (pouco comum entre a classe) e muito tímido... era gago.

O Saleem convidou-me para lanchar em sua casa e eu fui. Conheci o pai, a mãe, irmãs e irmãos, todos radiantes por me verem, recebendo-me sem constrangimentos numa casa muito humilde de um bairro pobre dos arredores. Como eram muçulmanos e estamos a meio do Ramadão, a família inteira estava a cumprir jejum - e por muito que eu recusasse (nem que seja por respeito), fizeram questão que eu e o Saleem comêssemos qualquer coisa. Foi um daqueles serões inesquecíveis, este de conversa e risota com pessoas de uma cultura tão diferente, mas ao mesmo tempo com tantas coisas em comum. E qual não foi a minha surpresa quando, neste país de cricket e bollywood, a conversa foi parar ao Euro2004 e às duas derrotas de Portugal com a Grécia! Que sina a minha - como se não bastasse ter assistido ao drama no estádio.




Para me despedir de Jodhpur em beleza, no último dia acordei às cinco e pouco da manhã e fui de riquexó até um pequeno templo com uma vista FA-BU-LO-SA sobre o Forte Mehrangarh e a Cidade Azul. O nascer-do-sol em si não foi nada de extraordinário, mas estar ali sentado numa plataforma de cimento, enrolado num cobertor, ouvindo o som da chamada à oração de uma mesquita ao longe... sorri na direcção do crepúsculo e inspirei esta Índia que adoro, a sua espiritualidade, a sua simplicidade, a porcaria entranhada em tudo, as cores e os insólitos. Não havia um único turista à volta, era só eu e o meu amigo gago, mais três ou quatro indianos a meditar e a fazer yoga enquanto o sol subia ao fundo no horizonte, disfarçado pela poluição.

E depois Bombaim.

24/10/2004

MUDANÇA DE ARES

Duas semanas depois, fui dar uma volta.

Nao, nao estou farto de Bombaim - das jantaradas, das idas ao cinema, ao teatro ou a exposicoes de pintura. Nem das sessoes de bowling, das noitadas de karaoke, dos passeios familiares em Juhu Beach. Nao!, nao estou farto das festas nem das noites mais calmas, ah conversa ate as tantas em casa de alguem. A rotina de Bollywood tem qualquer coisa que agarra, nao me perguntem o que. E nao sao so os programas, mas tudo ah volta: as combinacoes e as mudancas de planos ah ultima da hora, todos os imprevistos, as muitas idas e vindas de riquexo - adoro.

Nestes ultimos 9 dias celebrou-se o Navrati, toda a India estava em festa, e la fui eu trajado a rigor para a danca dos pauzinhos, milhares de pessoas em conjunto a celebrar nem sei bem o que, aqui ha sempre motivos para festejar. E quando acabou o Navrati, foi feriado nacional para uma especie de ano novo, nao sei bem o que. Pelo meio houve um Festival da Forca Aerea, em Marine Drive, com os avioes a fazer acrobacias e a razar a multidao de 500 mil pessoas; houve eleicoes e "dias secos"; mataram um dos maiores terroristas da India, numa troca de tiros na selva; estrearam mais nao-sei-quantos filmes novos; acompanhei as filmagens de outros tantos... a India nao para, Bombaim muito menos, e a rotina de Bollywood baseia-se numa especie de "imprevistos previsiveis". Ou seja, nao contes com nada, porque tudo pode acontecer.

Mas como estava a dizer quando comecei, resolvi ir dar uma volta. Deixei Bombaim por uns dias, estou agora em Jaipur, que tambem nao eh grande novidade para mim - no ano passado vim aqui umas quatro ou cinco vezes. Cheguei ontem e tenho estado com o Ishak e Cia. (Manel, Kamal e Foca, abracos para todos!), amanha provavelmente vou para Mount Abu ou outro sitio qualquer no Rajastao. O meu plano inicial era ir mais para cima, para Manali, Dhramasala ou Armitsar, mas parece que o tempo esta pessimo por la, nao vale a pena, tenho de deixar para outra oportunidade.

Ontem ah noite fui ver um filme de terror indiano, uma mistura do "The Others" com o "Shining" e o "Sexto Sentido"... e ainda uma pitada do "Thriller" do Michael Jackson. Um fartote, portanto. Mas com muitos sustos a mistura, acreditem. Eu estava chocado com os pais e maes que traziam as criancinhas para este tipo de filmes, nao sei como eh que eh possivel... ate bebes de colo havia na sala, e obviamente com tantos gritos e sustos e efeitos sonoros, as criancas passaram a sessao a chorar. Mas o melhor foi quando o filme parou a meio, acenderam-se as luzes e apareceram alguns actores do filme, a perguntar se estava toda a gente a gostar da historia, se estavamos com medo, e depois ainda cantaram uma musica ao vivo, a capella, para promover um filme que vai estrear pra semana. E depois retomou-se normalmente com o filme... e viva Bollywood!!!

15/10/2004

NA "QUINTA DA CELEBRIDADE"

Era uma vez uma familia goesa que mudou o apelido Felizardo para Fizardo. Foram viver para Bombaim e tiveram um filho e uma filha. O rapaz, chamado Abbey, comecou a trabalhar em producao musical e a certa altura saltou da sombra e quase sem dar por isso era uma estrela pop com fans histericas nos concertos e esse tipo de rotinas. Quando juntou umas massas extra, comprou um bocado de terra no meio da selva, a 100km da cidade. Quase dois anos, tinha feito boas amizades com os locais e propos sociedade a um deles. Compraram 11 cabras, hoje tem 63. Diz que vai comprar um tractor, arranjar a casa para quando casar e fazer mais uns telediscos para garantir umas massas.

E foi nesta quinta que passamos os ultimos dias.

A quinta do Abbey foi o melhor que podia ter acontecido nestes dias de caos e loucura urbana. Depois das festas-filmagens-jantaradas, apetecia-me sair um bocado de Bombaim. E aquele passeio a Pune para ver o concerto dele, por muito giro que tenha sido, soube a pouco. Estes dois dias de paz foram uma delicia: muito descanso e boa vida, aprendi um jogo que quero levar para Lisboa, vai ser um sucesso (nao me lembro do nome); passeamos as cabras, fomos buscar ovos ao galinheiro e vegetais a aldeia mais proxima... e pescamos caranguejos ah noite. Foi pouco tempo, dois dias nao eh nada, mas ja estamos a combinar nova escapadela ah quinta da celebridade!

13/10/2004

AGENDA PREENCHIDA

Acabei de chegar de Pune, uma cidade a 3 horas de Bombaim. Fui para la com dois amigos, um deles eh cantor e tinha um espectaculo no Taj Blue Diamond, o melhor hotel da cidade. Saimos ontem de manha, passamos a tarde no relax e ah noite la fomos ao concerto do Abbey, que eh uma estrela pop ca do sitio, tipo telediscos na MTV e tudo, e eh um goes muito porreiro que eu ja tinha conhecido no ano passado, mas mal. Sabe dizer "fecha a porta", "domingo" e uma ou outra palavra em bom portugues, que apanhou do avo goes, que falava a lingua de Camoes.

Hoje voltamos para Bombaim, viemos nas calmas, a parar em tudo o que era terrinhas para tomar o pequeno almoco, tirar fotos, almocar, tirar mais fotos... enfim, na boa vida de quem anda em tournee, ate ja estamos a combinar irmos todos juntos a um concerto que ele vai dar em Calcuta no fim do mes.

Daqui a bocado vou jantar a casa de uma amiga minha, o pai dela é um velho realizador "reformado", muitos ja me devem ter ouvido falar do senhor, no ano passado tornou-se um bom amigo e uma especie de guru.

Os meus dias em Bombaim tem sido um bocado monotonos: muitas festas, almocar e jantar fora todos os dias, filmagens e muito cinema... uma macada. No outro dia fomos ver o "Bride and Prejudice", eh bem capaz de tambem estrear por ai, porque eh um filme realizado para o mercado internacional... mas ao bom estilo de Bollywood. Baseado no livro da Jane Austen, "Pride and Prejudice", conta as aventuras de uma familia indiana que quer casar as suas filhas com um ingles e um americano. Enfim, so rir. Muita musica a mistura, cores ao rubro e as maradices indianas pelo meio... um filme muuuuito light, com festinhas em Goa e tudo. :)

E por falar em Goa: "diz que" este ano vao mostrar pela ultima vez o S. Francisco Xavier. Quero ir la ver, obvio. Ainda tenho de investigar as datas, parece-me que eh em Novembro ou Dezembro.

De resto tudo bem, espero que por ai tambem.

Hoje foi dia de eleicoes, nao se fala de outra coisa, e esta semana ha festa todos os dias, porque eh o Navratri, um festival que ainda tenho de descobrir, acho que vou ver amanha.

Domingo vai haver um festival aereo na Marine Drive, vamos la ver se presta para alguma coisa... e depois quero ir a uma exposicao de pintura, nao se fala de outra coisa, supostamente eh muito boa. E depois vou o Benfica/Porto, que vai dar num canal de ca (!!!) e obviamente vou torcer quase como se fosse ao estadio, eheheh. Amanha vou para a quinta do Abbey (o tal que canta na MTV), pescar qualquer coisinha, passear de jipe, talvez cacar. Com cedilha, sff.

E ja vi vacas - muitas!

12/10/2004

AINDA NAO VI VACAS

Mentira: vi uma. Apenas uma - mas onde eh que estao afinal as suas santidades, que no ano passado via por todo o lado, a dormir no meio da estrada ou pacatamente a conversar umas com as outras? Se calhar ando distraido, mais concentrado nas festas e almocaradas, nas filmagens, nos jantares. Se calhar sou eu que ja estou a ficar habituado. Mas isso sao outras historias. Por agora, quero apenas que fique aqui registado: ao terceiro dia em Bombaim, ainda so vi uma vaca na estrada.

Nao tenho muito que contar, ainda. A nao ser as loucuras que sao normais neste cantinho tao especial do mundo. O drama familiar da irma de um amigo meu, que se divorciou e agora tem a familia a massacra-la para voltar para o marido, que a tratava abaixo de cao, tudo em nome da imagem; a comedia que eh a familia de outra amiga, o pai tinha uma loja de vinhos e supostamente eh um expert, mas nem sabia o que era um vinho do Porto, e no fim das contas ate tinha um em casa... no frigorifico! E a tia gorda, gordissima, que me esta sempre a fazer olhinhos e que, segundo os meus amigos, gosta de rapazinhos mais novos... que medo! Muito medo! E o empregado nepales, que nao fala uma palavra de ingles e quer que eu o leve para Portugal. E as aventuras de ainda outra amiga, que esta em Jakarta a trabalhar este mes e anda a ser interrogada pela Interpol, porque parece que o patrao indonesio eh um mafioso do pior. Enfim, nada como voltar a este mundo maravilhosamente louco.

E como ja deve ter dado para perceber, aqui nada de acentuacao. Acabou-se o bom portugues, nada de chapelinhos e til, esquecam as cedilhas e outras mariquices ortograficas. Lembrei-me de pelo menos facilitar um bocadinho com o "e" e o "eh", aceitam-se outras sugestoes.

11/10/2004

LÁ VOU EU!

Já dizia o Sr. Adão, nos bons velhos tempos da Praia Grande:

Lá vou eu! Ora bolas!

Lá vou eu!, para o meio das vacas sagradas e das pintas na testa. Lá vou eu!, para o país em forma de diamante, uma cidade que já foi portuguesa e depois inglesa e agora indiana. Lá vou eu!, para as festas de Bollywood, e quem sabe para umas caminhadas com vista para o Everest, e de certeza para uns demorados banhos no mar tão português de Goa. Lá vou eu!, para o meio do caos e da bosta e dos deuses e do frango com caril e, porque não?, dos Marajás e outras realezas. Lá vou eu!, ver intermináveis jogos de criquete, infinitos filmes indianos, taxis amarelos-e-pretos sem espelhos. Lá vou eu!, para o meio das estrelas de cinema, dos homens santos, dos intocáveis, dos pedintes, turistas e gurus. Ora bolas!

Lá vou eu!, para o aeroporto, daqui a pouco mais de uma hora; e daí a pouco mais de outra, apertem os vossos cintos, tioca a endireitar os bancos. Lá vou eu!

A PEDIDO DE ALGUMAS FAMÍLIAS

Finalmente a famosa fotografia com o Marajá de Jaipur!

Da esquerda para a direita: eu, Foca, Marajá Sawai Bhawani Singh, Manel e o internacionalmente famoso Kamal Hassan.

Mais uma vez parabéns, sua Alteza.


10/10/2004

O MARAJÁ FAZ ANOS

Falta uma semana para me enfiar num avião de regresso de Bombaim - vou passar uns meses à Índia. E passou uma semana desde que fiz anos. Mas o título do primeiro "post" deste blog, apesar de nos remeter para uma festa de anos, não tem nada a ver comigo. Melhor: não tem nada a ver com o meu aniversário.

Estava aqui às voltas com o design deste meu novo blog quando assim-como-quem-não-quer-a-coisa me pus a perguntar aos meus botões: o que é que vou escrever aqui hoje? Não tenho nada de especial para contar: a vida continua mais-ou-menos a mesma, a trabalhar e a contar os dias que faltam para a partida... quando, de repente, uma ideia: e que tal relembrar uma das muitas histórias vividas na Meia-Volta-Ao-Mundo? Um bocadinho de nostalgia nunca fez mal a ninguém; e já-que-fiz-anos, e já-que-tou-de-partida para a Índia... cá vai um lá-mi-ré da já famosa noite em que eu, o Manel, o Foca e o Lencastre (Kamal Hassan para os mais chegados) fomos convidados para o jantar de aniversário do Marajá de Jaipur.

A História reza assim, segundo o meu diário de viagem:

Depois de longa e atribulada viagem num autocarro de Goa para Bombaim, depois de quase-dezoito-horas num comboio a abarrotar até Jaipur, decidimos que precisávamos, para recuperar algum bem-estar físico e mental, de descobrir o sítio mais chique de Jaipur, onde pudéssemos tomar um café, um chá, ou beber um gin tónico. Precisávamos de paz, de um lugar imaculado – precisávamos de mimos. E qual não foi o alívio ao encontrarmos, mesmo ao pé do Hawa Mahal, o Palácio dos Ventos, uma seta a indicar um tal de “Palace Café”.

Será que é preciso dizer mais? Claro que é!

Porque mais que a espectacular esplanada num dos muitos pátios do palácio real, mais que as mesas e cadeiras impecáveis, os copos de vidro transparentes, os talheres onde brilhava o reflexo dos nossos sorrisos. Mais que os guardanapos de linho branco, dobrados com todo o cuidado – com carinho, atrevo-me a afirmar. Mais ainda que os muitos retratos de ilustres convidados, famosos vindos de todo o mundo, príncipes reis presidentes, actores e desportistas de sucesso, la crème de la crème. Estávamos numa esplanada de luxo, é verdade, com música ambiente e empregados fardados, tudo a rigor e ao mais requintado estilo colonial. Um rapaz a dançar e a abanar o pescoço para a esquerda e para a direita, um homem com um bigode enorme sentado no chão, a tocar cítara; ambos vestidos como mandam as regras – tudo pensado ao milímetro, tudo ao segundo. Mas mais que todo este luxo... o melhor de tudo foi depois de pedirmos a conta, já preparados para enfrentar o trânsito de volta ao hotel, quando um dos empregados se aproxima da nossa mesa e, cheio de cerimónia, nos explica que Sua Excelência, o Marajá de Jaipur, faz anos.

Muitos parabéns, portanto. O senhor completava naquela noite setenta e três primaveras... e a festa (meus senhores, a festa!) estava prestes a começar. Sim, uma festa... um marajá... um palácio real... tudo ali ao lado. Ali mesmo ao lado.

"Would you like to see the cerimony for the Maharaja’s birthday?"

Deixa cá ver: um palácio real no Rajastão... um marajá à antiga, com turbante e tudo... é convite que se recuse? Muito obrigado, bora lá ver isso.

Belisquem-nos, estaremos a sonhar? Seguimos o nosso anfitrião para dentro do palácio, atravessamos um corredor e outro pátio, mais um corredor e mais outros pátios, e depois um lugar cheio de cadeiras estrategicamente arrumadas e um palco onde já estavam sentadas várias pessoas... incluindo o menino-dos-anos.

Senhores e senhoras, o Marajá Sawai Bhawani Singh em pessoa.

Com turbante e tudo.

Sentámo-nos a ver a cerimónia, deram-nos o programa da noite e ali ficámos a assistir a uma espécie de entrega de prémios, onde as pessoas que mais se destacaram ao longo do ano eram condecoradas pelo senhor de turbante. Uma espécie de entrega dos Óscares com danças típicas e as cores e sons do Rajastão. Passou-se uma hora nisto, talvez um pouco mais, não fiz contas... e nós, para ser muito sincero, começávamos a ficar ligeiramente enfadados. Claro que tínhamos gostado da experiência, afinal não é todos os dias que se vê um Marajá ao vivo; mas começava a ficar tarde, estávamos cansados da viagem, tínhamos fome, queríamos voltar para o hotel.

Prestes a dar-de-frosques, acaba a cerimónia. O empregado do café vem ter connosco:

"The Maharaja will be honoured if you stay for dinner…"

Ou, por outras palavras... não, não há palavras! Há momentos, e aqueles que se seguem são dos muito especiais – daqueles que nenhum dos quatro imaginou alguma vez viver. Daqueles a recordar vezes sem conta, dos que se contam aos netos, dos que se lembram sempre a rir e com uma nostalgia enorme. E sem querer entrar em grandes exageros: estes foram momentos quase históricos, que sem dúvida marcam esta longa aventura e a elevam a outras dimensões.

Mas continuemos:

Um jantar no Palácio de Jaipur, por ocasião do aniversário de Sua Excelência, o Marajá Sawai Bhawani Singh! Um cenário a fazer lembrar as Mil e Uma Noites, num pátio enorme cor-de-rosa rodeado por paredes e torres, centenas de janelas rigorosamente trabalhadas, e no meio uma espécie de alpendre (que insulto, explicado assim!) onde estavam expostas algumas das glórias da cidade, de conjuntos de armas a manuscritos e pinturas, e ainda (e só!) as duas maiores peças de prata do mundo! Dois vasos enormes de prata puríssima, mandados construir em 1902 pelo Marajá Madho Singh II, por ocasião da sua ida a Londres, para assistir à coroação do Rei Eduardo. E porquê vasos tão grandes? Porque durante a sua estadia de quatro meses em Inglaterra, o senhor ia precisar de água sagrada do Ganges em quantidade suficiente para tomar banho... todos os dias!

Mas voltando ao jantar propriamente dito:

Entre as mais conceituadas individualidades da cidade e do Rajastão, quatro portugueses. Nós. Vestidos de t-shirt e calções, entre fatos turbantes saris... uns maltrapilhos, mas todos vaidosos. Uma chamuça aqui, uns pastéis ali, água para todos porque nestas paragens não se bebe álcool. E depois foi ver o Marajá a passear-se entre os convidados, muitos sorrisos e vénias, toda a gente a beijar-lhe os pés em sinal de respeito, o senhor e a respectiva esposa a sorrir e a agradecer. Quando finalmente nos vimos cara-a-cara com o real menino-dos-anos, este estica vigorosamente o braço, não dá sequer uma hipótese de nos baixarmos, e toma lá um bacalhau a cada um. Muitos parabéns e muitos dias destes, e como quem não quer a coisa:

"Your Highness, can we take a picture with you?"

E foi isso mesmo que aconteceu: tirámos uma fotografia. Melhor – tirámos a fotografia: os quatro com o Marajá de Jaipur, lado a lado em pose de estado.