01/10/2015

SÃO REFUGIADOS (parte 8)

E chegamos finalmente ao último destes pequenos episódios relacionados com os refugiados sírios, em Assos.

Mais uma vez, estava deitado de papo para o ar, a ver se aproveitava os últimos raios de sol - ao final da tarde ia-me embora para Çanakkale, de onde seguiria um nightbus para Istambul. E eis que oiço a sirene da lancha. Levantei-me para ver o que se passava - e eis que mesmo ao pé de nós estava um bote. Pareceu-me o mesmo da tarde anterior, com os refugiados equipados com coletes côr-de-laranja. Mas desta vez estavam "a sair".

A lancha passou pelo bote sem parar e continuou para junto das rochas. O traficante deve ter saltado à água - e pelos vistos escapou, porque depois de alguns minutos parada junto à praia, a lancha acabou por afastar-se e foi ter de novo com o bote. Que, entretanto, não tinha avançado nem mais um centímetro.

Depois de rondar também o bote, a lancha acabou por ir embora a alta velocidade, outra vez com a sirene em histérica gritaria. O bote original ficou ali para-a-frente-e-para-trás, chegou mesmo a aproximar-se mais da praia... mas a certa altura decidiu-se pelo "outro lado" e lá foi em direcção ao horizonte, às montanhas lá ao fundo, a uma vida nova, cheia de incertezas mas pelo menos com alguma esperança.

Uma ou duas horas depois: a lancha outra vez. Mas agora trazia um bote a reboque, cheio de gente. E foi depositá-los junto à praia. Não sei se era o bote que vimos sair antes, ou se era outro. Isto a esta distância começa a parecer-me tudo igual. Mas lá ficaram, junto às rochas, acabaram por saltar para terra e desapareceram entre as árvores.

Mais duas, três, quatro horas. Nem sei bem. Ia a tarde já bem avançada, "a esta hora já ninguém se mete ao mar". Ou não. Eis que os refugiados aparecem outra vez na praia, penso que eram os mesmos de antes por causa dos coletes, mas não posso garantir. E desta vez dividem-se em dois grupos... e lá vão em eles em dois botes mais pequenos. Nunca mais os vi.

2 comentários:

Rui Quinta disse...

Descobri hoje este blog (parabéns!) e fui ler estes relatos. Seria melhor se fosse fantasia. Antes fosse. Antes não fosse real a tragédia diária.

Cumprimentos!

Clara Amorim disse...

Obrigada pela partilha, Jorge!