26/07/2013

WRESTLING + CHOLITAS = ?!


Quem nos falou pela primeira vez do wrestling em La Paz foi o Rodrigo, o chileno com quem ficámos em Santiago:

"Não podes perder, é um espectáculo, não sei muito bem onde fica mas perguntas na rua que toda a gente sabe."

Vá-se lá perceber porquê, fiquei com a sensação de que havia qualquer coisa de ilegal, de proibido - onde só alguns tinham acesso. Qual não foi a minha surpresa quando, logo à entrada do meu hotel em La Paz, dei de caras com um cartaz na parede, em jeito de cartoon, anunciando o "Cholitas Wrestling".

Confesso que as minhas expectativas caíram abruptamente, fiquei um bocado desiludido por ser um programa tão turístico, esperava algo mais crú... mas não desisti, parecia-me tudo tão insólito, tão kitsch, tão "fora". E assim foi: reservámos o nosso lugar no tour de domingo à tarde.

O autocarro veio buscar-nos à hora marcada e ainda apanhámos outros turistas nos hoteis ali à volta: americanos a falar aos berros de pastilha elástica na boca; israelitas meio-hippies, meio-cool, todos vestidos de igual, com casacos "tradicionais" de lã de alpaca e padrões andinos; japoneses tímidos a fotografar tudo o que mexia do lado de fora da janela. E este tuga, e este indiano, a sorrir e a pensar "onde é que nós nos metemos".

Parámos num miradouro a meio caminho de El Alto, onde nos "deram" cinco minutos para tirar fotografias à cidade, vista de cima. À chegada ao "estádio", o driver explicou-nos mais ou menos como funcionava o programa, lembrando que quem quisesse ir embora mais cedo teria de ir por sua conta. Os israelitas encontraram ali uma desculpa para "mandar vir", e começaram a discutir que queriam ir embora mais cedo, mas a agência tinha que pagar o transporte, etc. Odeio dizer isto, mas é verdade: típico.


Mas vamos ao que interessa. Senhoras e senhores, o espectáculo está quase a começar. Entrámos num pavilhão quase cheio: nas bancadas havia família locais, velhos e crianças à mistura, muitas pipocas e algodão doce, sorrisos e máquinas fotográficas; e nas cadeiras, junto ao ringue, eramos quase todos estrangeiros, quase todos com a mesma expressão incrédula, ninguém sabia muito bem ao que vinha.

Que palhaçada!

Literalmente, porque o primeiro lutador a entrar era um palhaço. Com direito a florzinha que dispara água, nariz redondo vermelho, sapatos compridos. Mas havia algo de mórbido no palhaço, e cedo descobrimos que era o mau da fita, no primeiro combate. Ao mesmo tempo engraçado (o público ria às gargalhadas com o teatro), ao mesmo tempo perigoso (o público gritava e insultava-o quando fazia batota). E eu estava estupefacto com tudo aquilo, porque esperava um combate "a sério" e afinal estava a assitir ao programa familiar de domingo.



Os clichés do wrestling estavam todos presentes. Os lutadores muito melodramáticos, sempre muito raivosos, muito surpreendidos, a sofrer, a gritar, a roubar o microfone ao árbitro para clamar justiça, para jurar vingança. Os truques muito ensaiados, o árbitro escandalosamente parcial, o mauzão a usar a violar as regras e a ética e quaisquer códigos de honra, o bonzinho a sofrer até ao fim, a levar um "enxerto de porrada" para, no final, dar a volta à situação e em dois ou três golpes ganhar, para alegria das bancadas.

E à terceira luta: as cholitas.

Só rir!

Da entrada triunfal com direito a banda sonora e aplausos, à luta dentro do ringue, fértil em voos picados, cabelos puxados, gritos gritados e muita pancadaria ensaiada... a sério. Só rir.








E depois foi cholita contra homem mascarado, cholita contra com o árbitro, e um anão corcunda à mistura... isto é um autêntico circo, voam cascas de banana e cadeiras, os lutadores metem-se com os espectadores, várias vezes roçamos o limite do descontrolo e do espectáculo, chego a temer pela minha integridade. Uma cholita sai do ringue com um fio de sangue na testa, um dos lutadores é lançado pelo seu adversário para cima das pessoas, há crianças aos gritos, mulheres nas bancadas a abanar-se com leques, vendedores de pipocas a passar entre as filas apertadas de cadeiras, alguém levanta-se e espeta com um bolo de chantilly na cara de um dos lutadores, ele irrita-se e começa a atirar bolo para toda a gente... onde é que eu estou?, onde é que eu estou?!

Tudo acabou em bem. Confesso que nas últimas lutas já estava um bocado farto, o espectáculo não perdia nada se tivesse menos meia hora. No ringue ficaram prometidos novos duelos para o próximo domingo, mas por essa altura conto estar noutras alturas, num registo completamente diferente, em Machu Picchu.

Valeu a pena. Não tinha nada a ver com aquilo que eu estava à espera, mas valeu mesmo a pena. Que tarde!

No regresso ao hotel, parámos novamente no miradouro, para mais uma sessão de fotografias. À nossa frente a cidade espraiava-se no escuro, feita de mil luzinhas e sons. Que vista! Que paz.


UM PALHAÇO ZANGADO

Um filme de terror? Um pesadelo? Ou algo completamente diferente? Logo à tarde conversamos melhor.


25/07/2013

CHOLITAS, À SUCAPA ;)

Vestidas com múltiplas camadas de saias, xailes coloridos e cartolas, as cholitas são um símbolo muito próprio da identidade de La Paz. Normalmente muito reservadas, de natureza tímida, rude e sofrida, esta espécie de nazarenas com chapéu à gentleman inglês e longas tranças negras são o produto de tradições indígenas, hábitos familares e até modas.

Até à chegada de Evo Morales à presidência da Bolívia, as cholitas sofriam vários tipos de repressão pela sociedade cada vez mais ansiosa de se modernizar. Proibidas de ingressar na Universidade, eram tidas como ignorantes. E provavelmente porque sempre foram postas de parte, por vezes marginalizadas e nunca tiveram facilidades na vida, ganharam resistência, força e muita garra. E são reconhecidas por isso.

Nos mercados e na rua, é vê-las a passar com cargas enormes às costas, enroladas nos seus cobertores super-coloridos. Correm de um lado para o outro, sentam-se em grupos à conversa, viram a cara sempre que uma câmara fotográfica surge na paisagem.

Como um gang de redondas e coloridas curvas, de feições ao mesmo tempo rudes e maternais, as cholitas são o vestígio de algo que - muito provavelmente - acabará por desaparecer.

Sorrateiramente, nos meus passeios pela cidade fui fotogrando esta e aquela cholita. Ficam algumas imagens:








24/07/2013

UMA ESPÉCIE DE MARRAQUEXE?

Imagine Marraquexe. Ou outra cidade marroquina, com paredes em tijolo ainda por pintar, antenas parabólicas num skyline de ângulos rectos, trânsito q.b. e coloridos bazares cheios de gente e cheiros e vida.

Agora retire o deserto e as mesquitas a essa cidade imaginada - e substitua por igrejas coloniais e os Andes.

Bem-vindo a La Paz.

NOCTURNO PARA LA PAZ

Ainda ofuscados pelo branco-e-azul do Salar de Uyuni, atravessámos aos solavancos a noite escura do antiplano boliviano, num autocarro com destino final em La Paz.

Assim que chegámos à capital, pusemos as mochilas às costas e avançámos pela cidade adentro: eu, o Bunty, as duas dinamarquesas e a alemã. O hostel que fora recomendado às dinamarquesas estava cheio, e muito sinceramente inspirou-me pouco. Era uma casa antiga com corredores enormes, pátios interiores e espaçosas camaratas... o lugar até era giro, mas a pulseirinha colorida para saberem quem estava lá hospedado ou não... e as festas temáticas com desconto para australianos... e os tours cheios de mochileiros jovens com sotaque à holywood e cervejas grátis...

De qualquer forma: estava cheio.

Abreviando: ficámos três dias em La Paz. Passeámos pela cidade e passámos algum tempo no quarto a lidar com as consequências da altitude - sempre são quatro mil metros, e ao fim de um dia de caminhadas e correrias... :/

23/07/2013

1... 2...

...saltaaaa!!

É um cliché, toda-a-gente-faz... mas exactamente porque toda-a-gente-faz. Tem de ser. Vir ao Salar de Uyuni e não tirar fotografias a saltar e a fazer poses parvas... pois.

Olha nós aos saltos!








22/07/2013

TERCEIRA PARAGEM: SAL

Depois das bandeiras e da ilha, percorremos mais uma parte do Salar - e quando parámos pela terceira vez, foi para "ver melhor" do que é feito esta enorme extensão de branco:






SABIA QUE... #10

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...a ilha de Incahuasi é "o-que-resta" de um vulcão pré-histórico.

O antigo vulcão foi submergido há cerca de quarenta mil anos, quando a paisagem em redor se transformou num gigantesco lago. E porque nada fica igual durante muito-muito tempo, neste planeta que insistimos em chamar "nosso", o tal lago acabou por secar e nasceu o postal que hoje conhecemos: o maior salar do Mundo - com uma ilha de quase 25 hectares no meio. A Isla Incahuasi.

Ou, se quisermos traduzir à letra: a Ilha da Casa dos Incas.

Logo à chegada, almoçámos numa mesa de sal - e já de papo cheio, fomos então explorar aquela a quem muitos chamam a "ilha dos cactos". Eis algumas fotos: