Depois de uma primeira noite recheada de estrelas e sonhos,
o segundo dia acordou cinzento e chuvoso. Passámos toda a manhã dentro do ger,
já a desesperar porque era impossível sair. Só o coreano, que obviamente estava
preparado até para o Dilúvio, é que sacou do equipamento de chuva e lá foi
passear.
Felizmente, depois de almoço o tempo melhorou. O japonês foi
embora para UB, o coreano estava algures a explorar - sobrava eu, os
holandeses, os ABBA, a espanhola... e o americano? Onde está o Eric?
"Foi embora com o japonês, não estava a gostar disto
aqui, prefere ficar no hostel onde tem net e está mais confortável."
Hmmm. Ok.
Mal acabámos de almoçar, saímos para mais um passeio a pé.
Estava prometido uma cavalgada à tarde, mas só alguns queriam repetir a dose -
eu inclusive, pois já tinha percebido a técnica de acelerar o cavalo, e
esperava uma volta mais emocionante. Nem imaginava quanto.
A caminhada - essa, sim - foi emocionante. Decidimos explorar
uma montanha e subi-la até ao topo - e fomos, sem querer, pelo caminho mais
difícil. Foram duas horas de subidas a pique e escaladas, enfiados numa
floresta... para, na recta final, percebermos que havia um caminho muito mais
fácil. Mas a vista compensou tudo.
E quando voltámos ao acampamento, os cavalos estavam
prontos.
Saímos - eu, uma das suecas e o casal de holandeses (os outros
"cortaram-se"). Tinha-me calhado o Fartarotti, que não ligava nenhuma
aos truques que tinham funcionado com o outro, ontem. E que continuava a cantar
como se estivesse no Eurofestival da Canção.
Os miúdos levaram-nos pelo mesmo caminho do dia anterior, e
ao fim de meia hora a arrastarmo-nos pela estepe, e depois de muito insistirmos
que queríamos um trote ou um galope, pedimos para voltar para trás. Estávamos
fartos.
Foi então que eles cederam.
"Nós agora vamos por outro caminho, e galopamos um
bocado nessa parte."
OK. Vamos lá então.
E acelerámos. Primeiro um trote de dois minutos, limpinho,
sem problemas. Depois galope por um bocado, sentia-me um autêntico Ghengis Khan
a cavalgar na estepe, venham de lá os inimigos que eu dou cabo de todos. O
Fartarotti ameaçou com um passo de dança inesperado, quando um bocado de terra
saltou debaixo da pata de outro cavalo - mas aguentei-me sem dificuldade, e nem
sequer perdi a confiança. Tinha sido só um pequeno susto.
Abrandámos um pouco, eu e o holandês queríamos mais -
tínhamos adorado. Que sensação maravilhosa, há alguns anos que não galopava
assim, senti-me um miúdo outra vez, na quinta de uns amigos em Sintra, onde
costumávamos andar a cavalo por todo o lado.
Os miúdos também estavam entusiasmados. Depois de uns
minutos a passo, perguntaram-nos se queríamos mais.
"Sim!", respondi eu e o holandês.
As miíudas não estavam tão entusiasmadas. E continuámos a
passo mais umas centenas de metros. Mas os rapazes tinham ficado picados, e
acharam que podiam esticar um bocadinho mais a corda. Puseram os cavalos a
galope outra vez, eu já não era só Ghengis Khan, eu era o John Wayne e o Clint
Eastwood num só, eu era o Lucky Luke, o Zorro das estepes. O vento frio na
cara, o ritmo do cavalo a acelerar-me o batimento cardíaco, o calor da sua
respiração do seu corpo...
...e de repente.
O mundo pode mudar num momento.
Pode acabar tudo. Ou só transformar-se. Será que está
escrito? Haverá um Destino? Poderia ter sido evitado?
E de repente: mais uma reacção inesperada do Fartarotti, que
se assustou com qualquer coisa e travou a fundo enquanto, ao mesmo tempo, deu
uma guinada para a direita. Ainda o vi embater noutro cavalo, mas foi tudo
muito rápido, só senti a cara a bater na terra.
Tudo. Negro.
3 comentários:
Oh Jorge coitado.... agora que estava a parte mais emocionante do blog... pronto acabas e não contas mais.
Adoro ler os teus diários.
Um grande beijinho cheio de saudades
Tia Guida
Finalmente o mistério do sangue desvendado...!
Ainda assim, prevalece sempre o sentido de humor...
Espero que já esteja tudo curado!
Tudo negro?? Não podes terminar o artigo assim neste suspense!! Obrigada por partilhares estas experiências.
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