Chegou finalmente o dia de partir. Acordei moído, a energia meio em baixo, o joelho esquerdo dorido, tudo por causa da queda de mota do dia anterior. E sentia-me meio ansioso, nem sei bem explicar, o que era uma novidade relativamente ao meu estado de espírito dos dias anteriores: no meio de tanta combinação de última hora, despedidas e correrias, acho que até estive bastante calmo, meio a pairar, tendo em conta a mudança que se aproximava.
Ao contrário do que normalmente acontece em viagens “normais”, desta vez tinha começado a preparar as mochilas com alguma antecedência. A gestão da bagagem, aliás, era diferente de outras partidas. Não só pelo facto de ir passar uma temporada longa que, na verdade, nem sei bem quanto tempo vai ser... mas porque, sem casa, era toda uma logística entre O Que Vai e O Que Fica.
E o que fica, fica na box.
Ou seja: vai-e-vem e vem-e-vai... e há dois ou três dias que andava com a sensação de me faltar uma coisa ou outra... mas entre as corridas de Lisboa para a Praia das Maçãs e da Praia das Maçãs para Aljezur e de Aljezur para São Teotónio e de São Teotónio para Lisboa... ufffaaaa... até fico tonto... uma coisa ou outra poderia ter ficado esquecida em algum lado. Porque não? Ou talvez já a tivesse guardado na box. Ou, quem sabe, até já a arrumara na mochila. Portanto: se já tinha acordado moído e meio ansioso disto-e-daquilo, imagina quando me apercebi que não só me faltava “uma coisa ou outra”... mas toda uma mochila!
Enviei umas mensagens, viste a mochila?, será que está aqui?, será que deixei ali?, ou vai na volta e esqueci-me dela no autocarro?, e o que será que ficou lá dentro?, lembrava-me de uma camisas, roupa interior, uns livros, o champô... nada de grave, mas e se... enfim, fazer o quê? Ia para o aeroporto daí a um par de horas, não é agora que vai fazer falta. Tenho comigo o passaporte e cartões, escova de dentes, umas mudas de roupa e uns 30kg de mixórdias várias, pelo menos, entre as duas mochilas. Concerteza que me safo.
Ninguém sabia do paradeiro da mochila – e apesar do assunto não me sair da cabeça, mais por teimosia do que outra coisa qualquer, eu tinha mais que fazer. Passei o resto da manhã a apagar os últimos fogos, almocei com a minha mãe na Adega Minhota e lá fomos para o aeroporto.
O voo estava programado para as 15:40 e eu cheguei 2 horas antes ao aeroporto, como manda a etiqueta. Mas não havia nada anunciado nos ecrãs. Quer dizer: haver, até havia. Todos os voos excepto aquele em que eu ia voar. Estranho. Contudo, era um voo charter, e eu nunca tinha voado em voos charter. Será que é normal não o anunciarem? Será que há toda uma logística diferente para voos charter? Fui espreitar no flight radar... e lá estava o voo, mas anunciado para as 19:10! WTF?!
Pedi à minha santa mãezinha para me guardar a bagagem por uns minutos e saí disparado pelo aeroporto adentro, em mood barata tonta, à procura de respostas. Não havia balcão de atendimento da companhia aérea, mas rapidamente descobri o check-in, menos mal. Voltei para a fiel depositária das minhas bagagens e daí seguimos para o check in. Tinha acabado de me plantar na fila (pequena, que sorte!) quando fui abordado por uma agente de viagens com um dossier numa mão, caneta esferográfica na outra, a tomar notas e a riscar números, que me deu as boas tardes e entregou um voucher de 20 euros para utilizar em meia dúzia de lojas do aeroporto, porque o embarque afinal só ia começar às 17:30.
Eram 14:00, entretanto.
“Ah...”, acrescentou a senhora agente de viagens, com um sorriso ensaiado, “e já preencheu o formuláriozinho do e-ticket?”
“O quê?... desculpe, não sei do que está a falar.”
Só faltava revirar os olhos, a senhora agente de viagens:
“Então, nas notas que enviámos aos grupos estava bem explícito... toda a gente tem que fazer o e-ticket.”
Okay: mas eu não fiz o e-ticket. Eu sabia lá do e-ticket. Olhei para as famílias à minha frente, na fila. Voo charter. Já percebi:
“Notas de viagem? Minha senhora, eu não venho com nenhuma agência de viagens, estou a viajar por conta própria.”
A senhora agente de viagens tentou disfarçar um sorrisinho de coitadinho-que-pobrezinho, e já a despachar-me apontou para um QR code e rosnou com uma ponta de nojo:
“O link está ali. Sem e-ticket, não pode embarcar para a República Dominicana.”
República Dominicana?!
Mas tu não ias para o México, Jorge Vassallo? Explico já no próximo post.