29/07/2011

DESCOBRIRAM O TÚMULO DE SÃO FILIPE, APÓSTOLO DE JESUS

Encontrei esta notícia hoje no DN. Hierapolis é a cidade romana que fica mesmo "em cima" de Pamukkale. Para a próxima vou lá dar um abraço ao senhor.



Um túmulo, que se crê ser de São Filipe, um dos 12 apóstolos, foi descoberto na cidade de Hierapolis, na Turquia.

Segundo a agência turca Anadolu, o professor italiano Francesco D'Andria, em comando da exploração, disse que arqueologistas encontraram o túmulo da figura bíblica, um dos 12 discípulos de Jesus, enquanto trabalhavam nas ruínas de uma Igreja recém descoberta.

"Há anos que procuramos o túmulo do apóstolo Filipe", disse o professor à agência. "Finalmente encontrámo-lo nas ruínas de uma Igreja, que começamos a explorar há um mês". A estrutura do túmulo e os dizeres escritos nas paredes provam que ele pertence a São Filipe.

São Filipe, reconhecido como um dos mártires do cristianismo, deve ter morrido em Hierapolis, segundo cientístas, por volta de 80 Dc. Acredita-se que tenha sido crucificado de cabeça para baixo, ou decapitado. O nome Hierapolis significa "cidade sagrada".



27/07/2011

GRANDA TOTÓ

Voltei hoje para Lisboa. E quero desde já declarar, em voz alta e ao bom estilo dos grandes clássicos portugueses a preto e branco... sou um granda totó!

Passo a justificar o adjectivo: estava eu no aeroporto de Istambul, meio ensonado, noite mal dormida, sentado a fazer nada enquanto não era hora de entrar no avião... uns dez minutos, no máximo, não mais que isso... quando reparei que já quase toda a gente tinha entrado, pelo que me levanto, meio a correr, e em aceleradas movimentações para o corredor, reparo que um grupo de turcos se dirige ao lugar onde eu tinha estado sentado.

"Quaresma, Quaresma!", oiço-os chamar.

E não é que o próprio do Ricardo Quaresma estava sentado ao meu lado - ele e mais outros três, que não reconheci, mas devem ser também futebolistas portugueses - e eu perdi a oportunidade de tirar uma foto com o próprio.

Não é propriamente um ídolo (pelo menos para mim), mas tinha sido engraçado, dado o historial deste blog. E, vistas bem as coisas, foi por causa dele que passei a simpatizar com o Besiktas.

Granda totó!

26/07/2011

O LADO DE DENTRO

(ENSAIO SOBRE A MARSHRUTKA)


A paisagem do lado de fora da marshrutka tem suficientes atributos para, por si só, justificar uma crónica. Picos de montanhas cobertos de neve, verdíssimos vales e vertiginosos penhascos, cruas cicatrizes provocadas por deslizes de terras, pacatos rebanhos e respectivos pastores, riachos, quedas-de-água, a estrada a serpentear numa fotografia cheia de adjectivos.

Sim: a paisagem do lado de fora da marshrutka tem suficientes atributos para, por si só, justificar uma crónica. Mas não esta. Esta crónica não é sobre o lado de fora da marshrukta.

Esta crónica é sobre o lado de dentro da marshrutka.

E pergunta o leitor: o que é uma marshrutka?

Uma marshrutka é... hmmm... digamos que a marshrutka está para a Geórgia como o dolmus está para a Turquia.
Esclarecido? Talvez não. Recomeçemos, então.


Fui à Wikipedia à procura de uma explicação. Dizia assim:


Marshrutka é um taxi partilhado com rota definida, muito utilizado nos países da ex-União Soviética, nos estados do Báltico e na Bulgária. O papel da marshrutka moderna é similar ao de um minibus, em outros países.


E esta crónica (que já devia ter arrancado mas anda aqui "enrolada" em definições e distracções) é sobre o lado de dentro da marshrutka onde viajei, há pouco mais de uma semana, entre Tbilisi (a capital da Geórgia) e Kazbegi (uma aldeia nas montanhas, no norte do país, junto à fronteira com a Rússia).


Partida. Largada. Fugida.


Dentro desta marshrutka, viajava eu + nove:


1. um amigo georgiano, que conheci no couchsurfing - estudou Turismo na Áustria, fez Erasmus em Espanha, viajou de carro por Portugal e está de partida para um estágio nos Estados Unidos. Uma espécie de nómada moderno, portanto.


2. três beatas a benzer-se constantemente - uma muito calada, sempre a rezar; a outra igualmente silenciosa, mas sorridente e muito curiosa; e a terceira mais conversadora, cheia de entusiasmo, inglês arranhado, sorriso perpétuo.


3. dois peregrinos georgianos - um com ares de brasileiro, outro com ares de russo.


4. um casal de américas, vindos das chuvas de Seattle para visitar a mãe na Ucrânia - e aproveitaram as férias para viajar à volta do Mar Negro, mas parecem ainda mais perdidos que eu.


5. um homem com ar de lobisomem, ou um lobisomem com ar de homem - não percebi muito bem. Cicatrizes num rosto marcado, rugas cheias de histórias, traumas e sucessos, olhos brilhantes mas gastos pelo tempo e pela paisagem. Apenas três ou quatro dentes na boca, mas enormes. Pêlos a sair das mangas, a sair do colarinho, a sair de todo o lado. Mãos enormes, deformadas - mãos de predador.


Entrámos nesta marshrutka em Tbilisi, mas só depois de uma intensa discussão noutra viatura, onde era suposto termos viajado. Tudo por causa de uma pessoa que o condutor queria, à força, encaixar entre nós. Em protesto, o meu amigo austro-hispânico-americano conseguiu convencer sete passageiros a sair da carrinha - e depois de meia hora à procura de outro transporte, com as beatas em permanente oração e a fazer o sinal da cruz de dois em dois minutos, os américas a olhar à volta à procura de bananas e garrafas de água, eu a assitir sorridente a tudo e o lobisomem atento... atento... eis que surge a marshrutka. Esta marshrutka.


Saltámos lá para dentro, pouco depois apareceram os dois peregrinos e lá fomos nós para a estrada. Fiquei a saber que era fim-de-semana de peregrinação, que havia milhares de pessoas a dirigir-se à montanha para rezar e prestar homenagem a algum santo, não-sei-bem-qual, não-sei-bem-porquê. As beatas iam passar a noite a rezar na igreja, os peregrinos iam dar apoio a quem passava a noite a rezar na igreja. Os americanos queriam acampar na montanha e fazer yoga com vista sabe-se lá para onde, o lobisomem sabe-se lá que planos teria... a mim, só me apetecia descansar. Uma cama, duche de água quente e uma janela com vista para a montanha.


A paisagem do lado de fora da marshrutka, como disse, passava cheia de atributos e elaborados adjectivos. Mas esta crónica é, também já disse, sobre o lado de dentro da marshrutka.


E cá dentro fazia-se o sinal da cruz, três vezes de seguida, sempre que surgia na paisagem uma igreja. Cá dentro, sonhavam-se viagens e outros tempos. Aprendiam-se coisas novas, informações valiosíssimas, factos irrefutáveis como:


"O chip dos cartões de crédito são obra do Demo."


Juro que uma das senhoras disse isso.


Pedimos que explicasse, e "como toda a gente sabe, existe um 666 escondido nestes chips. E não são só os cartões de crédito. Os telemóveis também."


Por isso é que a senhora não tinha (como nos explicou) conta no banco, nem telemóvel, nem nada que tivesse um chip. Porque o chip é coisa do demónio, e vamos todos para o Inferno, e temos a alma possuída, etc, etc.


Tudo dito com um sorriso terno e olhos brilhantes. Quase tão brilhantes quanto os do lobisomem, que não pronunciou uma só palavra durante toda a viagem. Sempre atento. Sempre atento.


Os dois peregrinos expressaram a sua curiosidade pelos três estrangeiros (eu e os américas), tentaram contacto, arranharam how-are-yous e where-are-you-froms, foi divertido tentar perceber a história de cada um.


E as beatas benziam-se.


O meu amigo viajado ia cruzando as informações, traduzia-me histórias, irritava-se com as teorias mas não alimentava debates, ia arbitrando o ambiente dentro da marshrutka.


E o lobisomem atento... atento.


A marshrutka parou duas vezes, em toda a viagem. Saímos para esticar pernas, tirar fotografias, fumar cigarros, fazer xixi, apreciar a paisagem. Mas era no regresso à viatura que a verdadeira viagem acontecia. Nos sorrisos de cortesia, no importa-se-que-eu-abra-a-janela, na máquina apontada às montanhas, click click, esta foto vai ficar bem no blog.


Curvas e contra-curvas, de vez em quando um buraco, de quando em vez uma lomba.


E as beatas a benzer-se. Três vezes, vezes sem conta.


Chegámos ao fim da tarde a Kazbegi, quase-quase na fronteira com a Rússia, quase-quase na fronteira da minha paciência. Já fiz viagens (muito) mais longas e (muito) mais desconfortáveis. Mas depois de tanto tempo dentro de autocarros e dolmus, na Turquia, o meu estado de espírito na Geórgia estava muito mais virado para o dolce fare niente. Ou seja, quando finalmente parámos, foi como uma benção de Deus-Nosso-Senhor.


Não me benzi, como fizeram as beatas. Não beijei a moldurinha com a imagem de Jesus, como fizeram as beatas.


Mas sorri ao ver, no topo de um monte com um glaciar em pano de fundo, uma igreja. Que imagem! As nuvens a dançar atrevidas em redor, o sol a pôr-se atrás e a desenhar abstractos jogos de luz e sombra... e o ar fresco, tão fresco que arrepiava.


Bem-vindo a Kazbegi, pensei. E apaixonei-me.



25/07/2011

O LADO DE FORA

Do lado de fora da marshrukta, a paisagem é assim:











15/07/2011

ESTE BOCADINHO DE MUNDO QUE EU HABITO, EM T'BILISI

"Alma", diz-me a empregada em contra-luz, na varanda cheia de sol, enquanto eu afago a simpática boxer que me veio dar os bons-dias à mesa. "Alma", repete com um sorriso curioso. Levo a chávena de café com leite à boca com a mão direita, sem nunca parar de dar festas à cadela, que se abana toda, cauda tronco e pernas, contorce-se e respira como respiram os boxers, e o meu português para ela é o mesmo que russo, o que interessa é o tom que empresto às palavras "ai tão linda que tu ééés, uma cadela muito linda, muito linda, muito linda" - adora-me.

O hotel onde estou hospedado, em T'bilisi, não é bem um hotel. É uma casa de família, enorme como é suposto serem as coisas antigas, agora adaptada à necessidade de "fazer render". Tem quatro quartos de pé direito altíssimo, mobilados ao gosto de quem viveu anos sob domínio soviético, móveis pesados de madeira que conversam à noite connosco, relógios de parede há muito tempo a dar as mesmas horas, sofás que podiam ser tronos, alguns dourados e muitos cristais, porcelanas, cortinados que escondem mais a rua da gente que a gente da rua. Tudo a querer ser clássico. Este hotel não é bem um hotel, é uma casa que queria ser palácio.

O meu quarto tem duas camas: uma grande e uma pequena. Nos lençóis com flores estampadas, há mensagens em inglês. O da cama grande tem escrito "Merry Christmas"; o outro diz "You're very special to me". São as únicas palavras em inglês que cabem no hotel que não é bem hotel. A velha senhora que ontem me deu as boas-vindas - a dona da casa - fala apenas russo, que para mim é chinês. Os gestos ajudam à comunicação, claro - e uma ou outra palavra em francês são recebidas com um sorriso.

Mas voltemos à sala de estar, que não é bem uma sala de estar. É também escritório, é também sala do pequeno-almoço, é também museu. Numa casa antiga cheia de antigas coisas, esta sala é a jóia mais valiosa do tesouro. As paredes estão literalmente cobertas de quadros.

A velhota que fala russo salpicado de francês é, afinal, uma artista. O velho soalho avisa-me da sua chegada, o que não me impede de continuar a tirar fotografias às paredes. Dou-lhe os bons-dias ao vê-la entrar na sala, retribui-me a simpatia com um sorriso georgiano, orgulhosa pelo meu interesse na sua arte. Explico-lhe por gestos e meias-palavras que gosto muito da sala, começa a falar-me sobre a sua paixão, eu nada entendo mas muito sorrio, bêbado com a criatividade que me rodeia, sorrisos de rainhas e czars, cenas napoleónicas, naturezas mortas, cavalos a correr na floresta e camelos a atravessar desertos, mulheres a olhar o mar, o inevitável S. Jorge a matar o dragão. Até uma grávida nua há. Estas paredes contam histórias, contam uma vida.

Quem me dera falar russo.

Olho em redor, estudo os cantos à casa. Não são só as paredes que contam histórias. Há uma miniatura da Torre Eiffel em cima do armário das loiças. Há um computador ligado e muita papelada em cima da mesa de jantar. Há vários relógios de parede, todos eles parados. Um piano que não deve ser usado há muito tempo, vasos com rosas fresquíssimas, miniaturas de barcos, marinheiros a espreitar de uma janela, molduras sem quadro e quadros sem moldura. Há uma estante com livros em russo, livros em francês, livros em georgiano. Há uns cornos (de que animal serão?) pendurados a um canto, por cima de um sofá que às vezes deve servir de cama, pela disposição das almofadas. Uma ventoinha velha, uma ventoinha nova, um aquecedor a óleo, fotografias a preto e branco de um militar.

A novo sorriso meu, a senhora aponta-me o "balcon" e diz-me qualquer coisa que eu traduzo como "vai lá espreitar". Saio para a luz de uma manhã que parece Lisboa e, entre roupa pendurada, molas e vassouras, descubro pincéis e tinta, descubro cores e misturas de cores, descubro um quadro inacabado. "É o meu atelier", diz-me sem que eu entenda uma única palavra.

Depois chama-me de volta para a sala, a casa range à nossa passagem, mas não é um ranger de queixume, é só uma afirmação de idade, como se fosse preciso lembrar "eu sou antiga, eu sei coisas que mais ninguém se lembra, vi muito e ouvi mais ainda.

A cadela a enrolar-se nas minhas pernas num delírio de mimos que a velhota tenta a custo acalmar. Paramos junto a nada e então vejo duas pinturas em cima do aquecimento central. "Baby", diz-me. O inglês libertou-se dos lençóis e, palavra a palavra, promete conquistar terreno. Os retratos na parede não parecem aprovar a ideia, mas também não me parece que se oponham. Tanto lhes faz, já viram o suficiente para não se importarem com pormenores linguísticos. Quanto às pinturas que a senhora me aponta: são dois desenhos feitos pelo neto. Uma família de artistas, portanto.

De repente tocam à campaínha, acordo de uma viagem sonhada e a velhota já não está ali. Novamente a campaínha, oiço gritos e gargalhadas de uma mulher lá fora a chamar a outra cá de dentro, que não aparece. Decido ir ver o que se passa, entreabro a porta e sou surpreendido por uma tempestade de saudades, duas crianças e uma mulher, nem bons-dias nem quem-és-tu, entram a correr e aos gritos, a casa enche-se de alegria e saudades, prevejo beijos e abraços e estás-tão-crescidoooo, mas não fico para assistir. Recolho-me ao meu quarto, quero escrever um texto sobre este bocadinho de mundo que eu habito, em T'bilisi.







14/07/2011

T'BILISI - PRIMEIRAS IMPRESSÕES

Já acabou a Odisseia Turca - e posso garantir que foi um clássico. Uma aventura cheia de momentos inesquecíveis, desde o voo de balão na Capadócia ao nascer do sol no alto do monte Nemrut... o picnic junto às muralhas de Ani, a paisagem em constante mudança, o nargile e o café curdo no caravanserai de Diyarbakir... a arte e a história em Istanbul, os banhos nas piscinas e Pamukkale, o fogo-de-artifício em Ankara... são muitos (são tantos!) os momentos, foi uma viagem de highlight em highlight, ainda estou a digerir tudo - e, muito em breve, deixo aqui uma série de fotos para eternizar tudo.

Mas hoje escrevo de outras fronteiras. Estou em T'bilisi, na Geórgia.<
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Aproveitei estes dias de férias pós-grupo para variar um pouco de paisagem, e vim dar um salto a este vizinho. Vim sem guias e muito pouco pesquisa - sem informação nenhuma, nem dicas nem nada. E que bem que está a saber.

Assim sendo, e enquanto não partilho as fotos da Odisseia Turca, ficam algumas das imagens que marcaram as últimas 24 horas.





À primeira vista, T'bilisi é uma cidade medieval com muita arquitectura soviética, rasgos de pós-modernismo, boas estradas e condutores agressivos, muita gente a pedir esmola - e, ao fundo, montanhas. Na capital e em todo o país: montanhas.

Quanto aos georgianos: católicos fervorosos, falam russo mas arranham o inglês, orgulhosos porque inventaram o vinho, gostam de esplanadas, de fazer brindes, de conversar em voz alta. São curiosos e muito hospitaleiros. Têm alfabeto próprio, nem todos usam desodorizante - mas têm muito sentido de humor.

Ainda agora cheguei, mas já gosto disto.