Estava na Índia há mais ou menos doze horas. Calcutá
fora apenas um detalhe, um pormenor de logística: e agora estava a atravessar o
West Bengal, a caminho sabe-se lá donde, vacas e trânsito e gente... e a
buzina. Que irritante buzina.
Em Arambag, uma pequena cidade que só sabe que existe quem por lá
passou, troquei para outro autocarro - este estava quase cheio, quando entrei, e
apesar de três ou quatro lugares disponíveis, o espaço para as pernas era
tão curto que optei por me sentar na última fila.
Claro que tinha a noção que ia significar mais saltos e safanões, é sempre a mesma
coisa quando se vai nos bancos de atrás. Mas não tinha hipótese.
E foi como tinha de ser: só faltaram mesmo as cambalhotas,
porque de acrobacias foi a viagem fértil. Desta segunda viagem do dia já não
posso falar muito da paisagem - o autocarro ia tão cheio e eu tão apertado lá
dentro e concentrado em manter-me no meu lugar, que foi impossível
ver-o-que-seja.
O que não quer dizer que não tenha sido interessante, a
viagem. Aliás: se calhar até foi melhor assim - em vez da paisagem lá fora, fui
entretido pela paisagem humana "cá dentro". Ainda nem tínhamos
partido e já duas pessoas tinham iniciado conversa comigo. Um deles estava a
estudar Artes em Calcutá e tinha vindo passar o fim-de-semana com a família,
numa aldeia a meia hora de Arambag. O outro era fotógrafo e tinha ficado muito
curioso com a minha máquina. Depois destes vieram outros - uns com um inglês
mais trabalhado, outros mais básicos, uns mais tímidos e outros extrovertidos.
mas todos curiosos, como é apanágio na Índia.
Quando finalmente cheguei a Bishnupur, além de estar todo
partido por causa do aterrador carrossel que era a estrada (this road is very bad condition, terá
sido a frase que mais ouvi durante a viagem), sentia-me... feliz. Não sei
porquê, mas é a palavra que mais se enquadra com o meu estado de espírito. Não
aconteceu nada de especial no autocarro, nenhum acontecimento digno de nota, ou
que me tenha marcado profundamente. Não aprendi nenhuma grande lição, ou
pequena. Mas esta comunhão de curiosidades mútuas. Cheguei feliz.
Tem piada: uma das coisas que posso dizer que tenha sido
mais "marcante" nem sequer é dos momentos mais inspiradores. Quando o
estudante de Artes saiu do autocarro, meia hora depois de arrancarmos e depois
de já termos trocado contactos e tudo, despediu-se e disse:
"Chegas a Bishnupur às três da tarde. Liga-me que eu
amanhã vou ter contigo de mota e levo-te a ver os templos."
Agradeci, retribui as despedidas e mal o autocarro partiu, olhei
para o telefone e vi que eram duas e meia. Afinal
a viagem é mais curta, pensei. E porque a estrada era realmente má - só mais
meia hora de caminho eram boas notícias. Mas passaram-se trinta minutos. E mais
trinta. E não havia maneira de chegar. Entretanto a conversa prosseguira com
outras pessoas, por isso até ia distraído e a rir de tantos saltos e abanões.
Mas as horas: o tempo passava e nunca mais chegávamos.
Até que reparei no relógio do senhor sentado do eu lado
direito. Marcava uma e quarenta e cinco da tarde - o meu já ia muito mais à
frente, o meu já ia nas três e quinze. E foi então que percebi.
Tinha-me esquecido de mudar as horas, quando cheguei de
Bangkok.
Que estúúúúpido! ;)
Ou seja: eu não acordei às sete da manhã: acordei às cinco e
meia. Não me levantei às nove, mas às sete e meia. E não saí do hotel às dez -
saí para a rua às oito e meia. Nada mau.
Eu não parti no autocarro das onze, mas no das nove e meia.
E agora ainda vou ter de suportar uma hora de viagem - pelo menos!
Damn! ;)
2 comentários:
isto quer dizer que nao te fez mal nenhum dormir 1 hora e meia a menos, acordaste mais cedo, tiveste tempo para tudo e ainda foste no 1º autocarro..... aproveitas-te bem o dia! enjoy!
E à custa desta hora e meia de diferença, ainda tivemos aqui um divertido post! ;)
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