20/01/2014

BISHNUPUR (DE MOTA, A TRÊS)

Cheguei a Bishnupur a meio da tarde, ainda a adaptar-me ao mundo em meu redor. Bishnupur? Mas isso é onde, e é o quê? Não sei. Nem eu sei muito bem.

O meu objectivo principal, ao "planear" a primeira semana deste mês na Índia, foi fugir das cidades grandes, dos "must-see" das brochuras turísticas, dos lugares que eu já conhecia. Podia ter ido para directo para Bodhgaya (o destino final, antes de voar para Bombaim), mas alguma coisa me disse que devia primeiro explorar um bocadinho.

E porquê Bishnupur?

Porque ao pesquisar sobre vários lugares entre Calcutá e Bodhgaya, este chamou-me a atenção:

1. pelo nome, porque Bishnupur vem claramente de Vishnu, que é um dos meus deuses "preferidos" na mitologia hindu.

2. porque li que havia, nos templos desta antiga capital do reino Malla, referências ao Ramayana e ao Mahabharata - e fiquei com curiosidade de as "comparar" com aquelas que estão em Angkor e em Bangkok, por exemplo.

3. pelas fotos que vi na internet, pois os templos não só têm uma arquitectura muito própria, mas são de terracota.

Ou seja: estava na Índia há menos de vinte e quatro horas e de repente tinha chegado sabe-deus-onde, para ver sabe-deus-o-quê. Registei-me num hotel com nome de uma conhecida deusa, caí redondo na cama - e só acordei ao fim da tarde, o sol já posto, mesmo a tempo de dar uma primeira volta pelo centro da pequena vila, espreitar a internet num cybercafé (não há wifi aqui) e jantar.

E depois: cama. Amanhã é um dia novo.

Na manhã seguinte, o estudante de Belas Artes que tinha conhecido no autocarro apareceu de mota com um amigo. Combinámos ir ver os templos juntos e lá fomos "a três" na mota, eu ensanduichado entre os dois indianos, a sorrir porque nem fora preciso grande adaptação: ainda agora a viagem começara e já estava a viver uma aventura.

Quanto aos templos: que surpresa. Não é a primeira vez que isto me acontece, mas não deixa de ser surpreendente. A Índia é tão rica em termos de património, que mesmo numa terrinha perdida no mapa há vestígios arqueológicos destes, originais e de uma importanta histórica ímpar.

Noutro país, este lugar podia muito bem ser de visita "obrigatória" na rota dos turistas. Foi capital de um reino, tem particularidades arquitectónicas únicas, artesanato muito peculiar - e até gastronomia própria. Mas na Índia há tantos Taj Mahais, Kama Sutras e Marajás, que Bishnupur fica assim: meio-esquecida. Perdida no mapa.

Ou seja: como qualquer turista que se preze, adorei. Sou egoísta. Quero tudo só para mim. Não gosto de ver outros turistas onde estou. Como qualquer turista: quero exclusividade. Não é assim que acontece? Vamos à Torre Eiffel e ao Taj Mahal, a Angkor Wat e à Grande Muralha, ao Cristo Redentor... e queixamo-nos das multidões. Tanta gente. Queremos o Mundo só para nós.

Aqui está, então: Bishnupur. Nem um só branco à vista.

Sou só eu - e mais dois indianos. A três numa mota, como num filme de Bollywood.







Vishnu a sonhar na criação do Mundo, enquanto Lakshmi lhe massaja as pernas. É aqui que Brahma "é criado", a partir de uma flor de lótus que nasce do ventre de Vishnu.

A trindade hindu: Brahma (o criador), Vishnu (o protector) e Shiva (o destruidor). Vishnu está montado em cima do seu fiel companheiro "de armas", Garuda. Este é um dos meus personagens preferidos da Mitologia Hindu. Shiva, por sua vez, surge em cima do boi Nandi, como é costume.
 


Gostei do passeio e dos templos - mas mais do que a visita em si, confesso que o melhor foi mesmo a companhia. Se tivesse feito isto sozinho, tinha sido um pouco de "mais do mesmo". Mas com dois locais, ou quase-locais, foi diferente.

Conversa-conversa-conversa. Foi o que foi.

Entretanto, a meio do dia convidaram-me para os acompanhar no regresso - para ir com eles para a aldeia. Ficaria em casa do Kousik, uma casa "feita de terra", explicou-me ele, "porque somos pobres, mas a minha família ia ficar muito contente e honrada por te receber".

E recusa-se uma oferta destas? Mesmo que seja preciso viajar de mota durante três horas: três pessoas e duas mochilas enormes. Recusa-se uma oferta destas?

Mas essa já é outra volta. ;)

5 comentários:

Tânia Magalhães disse...

Como líder ou turista fazes-nos viajar!

Joana Fragoso disse...

é a familia que puseste a foto no fb?
espectaculo maninho!!!

Lv disse...

De fato é um povo extraordinário. Lembras-te quando fui conhecer a familia de um amigo teu numa aldeiazinha perdida no meio do nada? A alegria deles e das pessoas da aldeia por me conhecerem. Eles gostavam mesmo de ti e por isso teres-me levado lá era uma honra para eles. A imagem da mãe é muito importante para eles. Vinham todos e sentavam-se no chão a olhar e a rir para mim. E os olhos e os sorrisos. Marcou-me essa visita.

Clara Amorim disse...

Pois muito bem...
Venham-mais-crónicas que a noite ainda é uma criança! :)

Boa volta! disse...

O caminho faz-se caminhando, Jorge. Continua a dizer que SIM à vida e as aventuras continuarão a surgir.Estou muito curioso por seguir mais esta aventura.