O quarto dia no Parque Nacional Torres del Paine acordou
chuvoso e cinzento, mas depois do descanso, tínhamos mesmo de avançar. O meu
joelho estava um bocadinho melhor, o entusiasmo em alta - tomámos o
pequeno-almoço, despedimo-nos dos novos amigos e por volta das oito e meia
estávamos a sair.
O objectivo de hoje era avançar pela "base do W"
até ao Acampamento Italiano, e conforme:
- o ritmo conseguido
- as dores no joelho
- as condições climatéricas
podíamos continuar directos até ao fim, ou guardar aí a
mochila grande, subir até ao Vale Francês (na perna do meio do W) e descer
outra vez, apanhar novamente a mochila e continuar até a Paine Grande, o último
refúgio, o destino inevitável do dia de hoje.
Com novo arco-íris a acampanhar-nos durante parte do
caminho, avançámos por praias de seixos junto ao lago, embrenhámo-nos na
floresta - e apesar de um ritmo relativamente lento e uma chuva miudinha que
insistia em ir-e-vir, chegámos ao Acampamento Italiano com os espíritos em
alta. Decidimos subir um pouco a montanha, mesmo que não conseguíssemos chegar
ao coração do Vale Francês - pelo menos tentávamos ver alguma coisa. Rochas e
subidas íngremes, não foi nada fácil... e a descida prometia ser ainda pior,
porque este joelho permite-me subir com alguma dificuldade, mas para descer é
um inferno. De qualquer forma, estávamos inspirados - e a paisagem que nos
acompanhava ia melhorando, à medida que subíamos. Glaciares, montanhas cheias
de neve de onde caíam blocos de gelo, rios e cascatas, árvores derrubadas e
muita, muita pedra.
Decidimos que voltaríamos para baixo ao fim de duas horas de
caminhada, estivessemos onde estivessemos, para ter tempo de almoçar, voltar
para trás e chegar ao Acampamento Italiano com tempo suficiente de fazer o
restante caminho até ao próximo refúgio. Mas claro que à medida que subíamos e
perguntávamos às pessoas que passavam para baixo onde ficava o mirador, íamos
ficando mais perto, e a vontade de avançar "só mais um bocadinho" era
mais forte que a urgência de descer. Caminhámos quase três horas até que
começámos a discutir a hipótese de voltar para baixo.
E só quando nos cruzámos com o casal húngaro, com quem
passáramos parte da tarde de ontem, que decidimos voltar. Vinham desiludidos,
porque o céu estava tão carregado e o nevoeiro tão cerrado, que fora impossível
ver o Vale Francês, a partir do mirador. Parámos um pouco para conversar,
tirámos algumas fotos todos juntos - e quando eles retomaram a sua descida, nós
invertemos a direcção e também começámos a voltar.
Mas o Destino tinha planos bem concretos para nós, e por
milagre ou magia ou pura sorte, a meio da descida as nuvens começaram a
afastar-se, e exactamente na altura em que passávamos um descampado a que
algumas pessoas chamam "o primeiro mirador", eis que o Vale Francês
aparece a brilhar ao sol, mesmo à nossa frente.
Ok: não é a vista do último mirador, onde supostamente
estamos rodeados, a quase 360º, por montanhas. Mas mesmo assim era uma vista
espectacular, com os pináculos das montanhas a enxotar as nuvens, o céu azul a
sorrir para nós, estão a ver, valeu a pena, ainda bem que vieram, agora voltem
com calma e segurança.
E assim foi. Depois das fotos e dos uaus da praxe, voltámos
até ao Acampamento Italiano, pegámos na mochila grande - ou pegou o coitado do
Bunty, que eu tenho levado a pequena o caminho todo, desde que me magoei - e lá
avançámos, a sorrir com as voltas da Sorte, em direcção ao último refúgio.
2 comentários:
Que cenário fabuloso...!
Exótico!
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