Ou não. Não interessa. Estava, não estava. Aconteceu.
Estes dias. Esta longa viagem de autocarro, uma espécie de
teste, só pra ver se aguentas, pensavas que era assim de mão beijada, caía-te
no colo e já está. E depois a recompensa. O regresso a esta pequena amostra de
paraíso, a fina areia branca a enfiar-se atrevida entre os dedos dos pés, a água
transparente onde apetece ficar a tarde toda, os novos amigos e as coincidências, as conversas
intermináveis, novas gargalhadas e os mesmos debates, as opiniões e os planos, as lições de vida, as diferenças e as semelhanças. Somos todos iguais. Somos todos iguais. E depois o
reencontro com sorrisos que conheço de outras voltas - é tão bom estar de regresso às Perhentian.
Como já mencionei aqui, celebrou-se no passado fim-de-semana o Hari Raya Haji, um dos dias mais importantes
do ano para o Islão. É nesta altura que muitos muçulmanos fazem a tão sonhada peregrinação a
Meca, e é costume as famílias juntarem-se neste dia. Um dos momentos altos é o sacrifício de vacas, ovelhas ou cabras, que depois são oferecidas aos
vizinhos e aos pobres.
O meu amigo Yoe convidou-nos a celebrar com ele o
feriado. O Ahmed e o Omar, sendo também muçulmanos, estavam curiosos por ver
como se festeja o dia na Malásia. E eu, porque sou curioso por natureza.
Ou seja: depois de uma primeira noite a recuperar o sono e o
cansaço da viagem de autocarro, acordámos cedo e apanhámos um water-taxi*
para a vila piscatória da ilha, onde vive o Yoe. Quando lá chegámos, muita gente
dirigia-se para a pequena mesquita, respondendo ao chamamento. A maior parte
das pessoas estava bem vestida, em trajes tradicionais. Havia qualquer coisa de
Natal no ambiente. Muito giro. Sentei-me num banco de jardim com o Ahmed, que
estava de calções por isso não ia entrar na mesquita. O Omar seguiu com o Yoe e
os outros. E depois de acabar a "missa", saíram todos para a rua e
fomos comer a casa do Yoe, com a família.
Ainda passámos em casa de alguns vizinhos para provar as especialidades de cada um - mas a experiência ganhou outro interesse quando assistimos ao "ponto
alto" destas celebrações: o sacrifício do animal.
Havia umas oito ou nove
vacas espalhadas pela vila, compradas pelos locais e trazidas, de barco, do continente
para a ilha. Muitas crianças nunca tinham visto uma vaca na vida.
Foram
sacrificadas à frente
de toda a gente, ao estilo de uma matança do porco.
Confesso que não é
espectáculo para qualquer um ver. E por isso mesmo não publicarei algumas das
fotos que fiz. Ficam algumas menos explícitas:
Enfim: choque cultural é isto mesmo. Podes não gostar do que
vês, pode fazer-te confusão, alguma comichão, ou podes entender perfeitamente e
quem sabe até gostar. Ser confrontado com outros processos, outras soluções,
outras fontes. Descobrir outras ideias, conceitos e preconceitos.
Mas adiante: pequeno-almoço e matança pela manhã, snorkeling tour da parte da tarde.
Exactamente: não mergulhei. Já não tive tempo para me organizar, mergulhar e
ainda voar de volta para KL. Desta vez tive mesmo de me (voltar a) contentar
com o snorkeling. Mas foi giro. Na companhia dos dois egípcios e de um grupo de
dez estudantes do Médio Oriente na Malásia, que passaram a tarde a rir e a
cantar, a bater palmas, isto noutra circunstância podia ter sido cansativo ou
mesmo irritante, mas foi muito divertido. Não é todos os dias que se conhece
gente do Sudão, Iémen, Djibuti, Oman, Arábia Saudita.
O segundo dia foi bem mais calmo, a ressacar a festa na
praia da noite anterior. Os egípcios voltaram para KL a meio da tarde, eu
fiquei a descansar na praia, a pôr a leitura em dia, a escrita, o sono... que dias
bons, que tónico perfeito para recuperar da quantidade de voos e corridas dos últimos tempos.
Agora sim: a bateria está carregada para a época que aí vem,
na Birmânia e na Indochina.
* water-taxi é um barco a motor que, a troco de um valor, leva pessoas do ponto A ao ponto B. Como um táxi, portanto. ;)
1 comentário:
Mais uma crónica que vale ouro!!! :)
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