Larguei a minha bicicleta e fui a correr até perto do meu
amigo. Estava sentado no chão, de cabeça baixa mas a rir baixinho, perplexo com o que lhe tinha acabado de acontecer. No entanto, era mais o cansaço que o dano. Tinha
esfolado um dos joelhos e doía-lhe um braço e o pulso, mas percebi logo que
não era nada de grave.
E apesar de apetecer descansar e recuperar forças - porque
esta queda era um claro sinal de que estávamos a precisar disso -, não tivemos
outra opção senão prosseguir. Como já disse antes, o sol tinha desaparecido e a
temperatura estava a descer. Não nos podíamos "dar ao luxo" de não
encontrar uma estrada. O mais depressa possível, se faz favor.
Tinha visto umas árvores ao longe e foi para elas que nos
dirigimos. Embrenhámo-nos numa vegetação cada mais densa, convencidos que tinha
de haver alguma coisa ali, nem que fosse uma horta, um poço, qualquer vestígio
de actividade humana.
E o instinto provou estar certo: um pouco mais à frente
encontrámos um carrinho de mão e umas tábuas, aparentemente abandonados nas
ervas. Continuámos e vimos uns baldes. E uma horta! E algures... mais à
frente... obrigado, sorte: uma casa. Um cão a ladrar. Uma criança a brincar
perto de um carro. Estamos salvos ;)
Perguntei em tom de amigalhaço onde ficava a estrada para
San Pedro, como se nada fosse, como se nem estivéssemos com sede e cansados e
um-tanto-ou-quanto desesperados. O miúdo apontou para um caminho que ia dar a
outra casa... e outra... e à medida que avançávamos, apercebemo-nos que
estávamos numa pequena aldeola de cinco ou seis casas. Um velhote chamado
Samuel juntou-se a nós e assim fomos à conversa, entre muros de lama e pedras, com um
cão muito simpático sempre a correr à nossa volta, o senhor estava muito surpreendido por ver um indiano, uma pessoa de tão longe... e eis que de repente surge uma estrada - a
estrada "principal"!
Ao fundo, do lado direito, vimos no topo de um pequeno monte a tal igreja que fora, desde
o princípio do passeio, o nosso objectivo. Para a esquerda ficava San Pedro.
"Deixa lá a igreja em paz, já vimos muitas nesta
viagem. E outras virão. Vamos para casa."
Dito e feito. Despedimo-nos do Samuel e pé no pedal, que se
faz tarde. A estrada agora seguia ligeiramente a descer, só não fomos mais
depressa porque o Bunty estava cheio de dores. Mais à frente, passámos junto à
entrada da Garganta del Diablo, onde começara esta longa e árdua aventura de uma tarde. Cruzámo-nos com um grupo de cinco ou seis hippies locais, que caminhavam descalços com
mochilas carregadas sabe-se lá do quê, guitarras debaixo do braço e garrafas de vinho. Iam passar a
noite no desfiladeiro. Cumprimentámo-los e continuámos pela estrada fora, atravessámos os
mesmos riachos de antes - e quando finalmente chegámos a San Pedro de Atacama, já era noite cerrada.
O rapaz da loja das bicicletas estava preocupado connosco - achava
que nos tínhamos perdido, algures no deserto.
Perdidos... nós?!
Que ideia... ;)
E porque um dia intenso como o de hoje não podia acabar sem
mais uma emoção forte: quando chegámos ao hotel, a menina da recepção veio a correr
ter connosco, desta vez menos sorridente, a dizer que tinham ligado várias vezes da agência de viagens e
que precisavam de falar urgentemente connosco.
E agora?! Não me digam que vão cancelar o passeio à Bolívia... só nos faltava mais esta.
1 comentário:
Eu não acredito ... Só faltava mesmo isso.
Queremos a continuação urgente :)
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