O fim-de-semana que hoje quero lembrar aconteceu há uns quinze dias. Estava ainda a viajar com o grupo da Nomad, depois de uma semana a descermos o Vietname. Ao contrário do que é habitual com a maioria dos grupos que me acompanham na Indochina, desta vez não tínhamos saído à noite em Saigão. Mea culpa, que estava um bocado em baixo com dores de cabeça e a barriga às voltas.
Tudo fresco e desperto, portanto, quando nos enfiámos no autocarro a caminho do Cambodja.
O trânsito nesse sábado de manhã estava especialmente compacto, vá-se lá perceber porquê, e demorámos ainda mais tempo que o habitual para sair de Saigão. Rodeados de motas carregadas com tudo e mais alguma coisa - o que nem é novo. Ou seja: chegámos atrasados à fronteira, e chegámos atrasados a Phnom Penh. Uma hora e meia, para ser mais exacto.
Os "meus" tuktuks estavam à nossa espera, como é costume. Levaram-nos ao hotel e combinámos uma hora para o dia seguinte - e pouco depois do grupo se instalar nos seus quartos, estávamos todos na recepção outra vez, preparadíssimos para ir dar uma volta.
Até aqui nada de novo, pelo menos para mim. Isto é trabalho - mas é trabalho que se faz com gosto. E quanto. Que bem que me sabe quando chego ao Cambodja. Eu sei lá que energia tem este país - e até mesmo esta cidade, feia e suja... mas há coisas que não se explicam, e para quê gastar latim e massa cinzenta para tentar descrever o que não consigo explicar? Gosto do Cambodja. Gosto de cá voltar.
Fomos dar uma volta.
Fomos pela marginal, no enorme passeio cheio de gente a fazer jogging e ginástica, ou simplesmente sentados à conversa, ou a namorar, ou a pedir esmola. Caminhámos paralelos ao rio até ao Night Market, e desafiei o grupo para nos sentarmos no chão, tal como os locais. As esteiras de palha estavam cheias de famílias e grupos de amigos a comer, alguns turistas - e nós juntámo-nos à festa. Mandei vir noodles com isto-e-aquilo, alguns fritos e até uns springrolls. E jantámos, que risota - este grupo foi-se (e foi-me) conquistando aos poucos, por esta altura já existia uma cumplicidade muito própria, várias energias diferentes, feitios e modos de estar. Mas foi esta diversidade que deu alma ao grupo, foram as diferenças, mais que as semelhanças, que aproximaram uns e outros, que deram cor à viagem, que acrescentaram sabor à aventura.
Ainda houve tempo para comprar kromas - os panos que os locais usam para tudo e mais alguma coisa - e para comer os melhores gelados neste lado do Universo, no Blue Pumpkin; e acabámos a noite a beber um Porto no rooftop do Frangipania, tragicamente rebaptizado de Ibiza Lounge.
E por falar em tragédias (infelizmente incomparáveis a um nome foleiro de um bar): na manhã de domingo fomos de tuktuk conhecer Tuol Seng - o Museu do Genocídio (também conhecido por S21) - e os Campos da Morte, duas testemunhas bem cruas do que foi o regime de terror de Pol Pot e os seus Khmers Vermelhos, nos anos setenta.
Aligeirámos o tom ao almoço, no Laughing Fatman, onde o grupo experimentou pela primeira vez o Amok (o prato nacional do Cambodja) e depois fomos a pé até ao Palácio Real e o Pagoda de Prata, que visitámos. Dei algumas luzes ao grupo acerca do significado das posições do Buda, e a certa altura até fomos convidados para tomar um chá com o Rei - mas tivemos de recusar pois a agenda já estava cheia para esse final de tarde: íamos assistir a um combate de Boxe Tradicional Khmer.
Os combates de domingo em Phnom Penh começam a tornar-se um hábito na viagem da Indochina. Realizado num estúdio de televisão e transmitidos em directo na BayonTV, este evento acaba por funcionar como uma versão mais económica e mais genuína que o Muay Thai (mais económica porque ao contrário de Bangkok, não se paga; e genuína porque apesar de agora já se ver um ou outro turista, a esmagadora maioria do público é local).
Apesar desta semana termos saído mais cedo do centro da cidade, quando chegámos ao estádio/estúdio já estava completamente a abarrotar. Esta semana o combate era especial, com alguns boxeurs da Tailândia, e o estúdio estava decorado a rigor, com um palco cheio de luzes e ecrãs, efeitos especiais e até fogo-de-artifício. Sentámo-nos junto ao palco, numa espécie de bancada VIP criada para o efeito, e antes dos combates propriamente ditos tivemos direito a assistir à actuação de artistas locais de renome. Não me perguntem os seus nomes - mas se querem mesmo visualizar a coisa, imaginem uma versão khmer da Jeniffer Lopez, e outra dos One Direction um bocadinho mais hip hop. Que noite!
O público estava especialmente "arrebitado", as lutas emocionantes - e apesar de um arranque demorado, a verdade é que foi um bonito espectáculo de ver. Quando saímos para a rua, no final, vínhamos com a adrenalina em alta. E quando chegámos ao hotel e nos encontrámos com aqueles que tinham optado por ficar no centro da cidade a fazer massagens, as energias não podiam ser mais diferentes.
No entanto, como já expliquei: este grupo alimentou-se das diferenças para construir a sua personalidade. E até neste momento isso funcionou. Lá fomos jantar, uns todos zen com as massagens, outros bem activos com o evento de boxe - e ao final da refeição repetimos uma proeza já feita ao pequeno-almoço, e que acabei por não partilhar logo aqui. Cantámos os parabéns ao Alberto, um dos nossos companheiros de viagem. Mas enquanto de manhã a surpresa foi do grupo ao aniversariante, agora fora o próprio que me pedira para organizar um bolo para surpreender os outros.
Energia boa.
E assim se passou mais um fim-de-semana. Dois dias, múltiplas emoções e vivências, a acrescentar àquelas que viveramos nos dias antes no Vietname, e às que viríamos a experienciar depois, em Siem Reap, Bangkok, Vang Vieng e Luang Prabang.
O grupo já voltou para Portugal, eu estou a "queimar os últimos cartuchos" em Bangkok.
E daqui a quase-nada: Lisboa.
Conheçam as datas das próximas edições da Indochina em http://www.nomad.pt/indochina-com-jorge-vassallo
1 comentário:
Leitura boa para toda a manhã!!!
Venham mais!!!
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